A deputada Luciana Genro (PSOL) e os demais integrantes da Comissão de Representação Externa ouviram, na tarde desta sexta-feira (3), mais quatro convidados a respeito do incêndio da Secretaria de Segurança Pública. Na reunião, foi abordada a questão da assistência psiquiátrica e psicológica aos bombeiros que participaram da ocorrência, a qual ocasionou a morte de dois profissionais, e dos familiares das duas vítimas.
O incêndio ocorrido no dia 14 de julho no prédio da Secretaria causou a morte de dois bombeiros, o tenente Deroci Almeida e o sargento Lúcio Ubirajara de Freitas Munhós, vitimados pelo desabamento da estrutura do edifício. A Comissão coordenada por Luciana Genro, aprovada em Plenário no último dia 17, já ouviu entidades da categoria, o Comando do Corpo de Bombeiros, os policiais que formulam o inquérito sobre o caso, e especialistas das áreas de engenharia e arquitetura. Na próxima segunda-feira (6), as viúvas do tenente Deroci e do sargento Munhós também serão ouvidas.
“Além de buscar as causas do incêndio e acompanhar a investigação, queremos que a nossa Comissão também possa fazer algo que nenhuma outra instituição está fazendo, que é avaliar como o Estado lida com essa tragédia que se abate nas instituições, dentre os bombeiros e policiais militares. Queremos saber como os familiares e colegas são acolhidos nessas circunstâncias, uma avaliação tanto geral da situação do atendimento psicológico, quanto específica em relação ao caso”, iniciou a deputada.
O sargento Ubirajara Pereira Ramos, coordenador-geral adjunto da Associação de Bombeiros do Rio Grande do Sul (Abergs), relatou que a entidade esteve presente num primeiro momento durante o combate ao incêndio buscando dar apoio com suprimentos, como água e alimentação. Ele relatou outros casos de bombeiros mortos em serviço, tanto em combate ao fogo quanto em acidentes, e afirmou que há um número alto de suicídios também na corporação. “A política de atendimento deve ser mais completa, tem que ter um acompanhamento no dia a dia. Não é o familiar que tem que procurar o Estado, é o Estado que tem que procurar”, opinou.
Ele e a major Cristiane Nunes de Oliveira, coordenadora de secretariado da Abergs, usavam camisetas amarelas devido à campanha de prevenção ao suicídio, Setembro Amarelo. Ela complementou afirmando saber que pelo menos dois bombeiros que atenderam à ocorrência estão afastados por questões de saúde mental após o caso. “Principalmente as pessoas que encontraram os dois corpos, pelo estado em que estavam, tiveram um impacto maior. Porque é diferente ouvir falar e ver. Esse ‘ver’ muitas vezes são imagens que não saem da cabeça”, apontou.
Atendimentos do Hospital da Brigada Militar
Os bombeiros seguem sendo atendidos pelo Hospital da Brigada Militar (HBM), mesmo não estando mais diretamente atrelados à corporação. A major Cláudia Vargas, chefe de psiquiatria do HBM, representou a instituição e relatou o trabalho que vem sendo feito em relação ao incêndio da SSP. Segundo ela, houve acompanhamento com uma profissional imediatamente a partir da ocorrência, inclusive na casa dos familiares do tenente Deroci, enquanto ele ainda estava desaparecido. Em seguida, a Cruz Vermelha assumiu os trabalhos de saúde mental e a equipe do HBM retornou no dia em que foram localizados os corpos.
“Foram duas pessoas da nossa equipe para acompanhar esse momento, quando também foi feito apoio aos familiares do sargento Munhós. A partir desse primeiro contato, o subcomandante enviou uma mensagem expressa determinando que todos os bombeiros que participaram da ‘zona quente’ deveriam passar por uma avaliação psicológica. Então se montou uma força-tarefa que envolveu 17 profissionais da nossa instituição e mais de 200 bombeiros foram atendidos, a maioria em grupos de no máximo 12 pessoas”, explicou a major.
Após o atendimento em grupos, cada bombeiro podia optar por seguir o acompanhamento no hospital ou não. A capitã Isadora Rocha dos Santos, psiquiatra que participou de três sessões, disse que alguns deles não conheciam o serviço e foram conversar com os profissionais pedindo encaminhamentos e fazendo perguntas. “Pelo menos dois ou três atendimentos vieram posteriores dentre os três grupos que eu participei. Alguns ficam receosos sobre a questão da confidencialidade, e a gente sempre explica que tem o compromisso ético de não passar informações”, afirmou.
Questionadas pela deputada Luciana Genro sobre se há mudanças legislativas que poderiam auxiliar no trabalho do HBM, a major Cláudia trouxe a questão da forma de contratação dos profissionais de saúde mental. Os psicólogos são contratados por licitação, enquanto em outras áreas do hospital existem militares temporários de saúde. Ela avalia que seria um “ganho tremendo” caso fosse possível haver, dentro do quadro de temporários de saúde, profissionais da área de saúde mental. “Teríamos profissionais mais estáveis daí, com uma identificação com a corporação. Em outras áreas, os terceirizados foram substituídos por temporários de saúde e isso fez uma diferença enorme. Esse é um ponto que gostaríamos de mudar”, sugeriu.