Audiência pública ocorreu por proposição da deputada Luciana Genro, na Sala Adão Pretto.
Audiência pública ocorreu por proposição da deputada Luciana Genro, na Sala Adão Pretto.

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Estudantes, professores e funcionários da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS) levaram à Comissão de Educação da Assembleia Legislativa relatos e reivindicações sobre a instituição. Uma audiência pública proposta pela deputada estadual Luciana Genro (PSOL) foi realizada na segunda-feira (06/06), como encaminhamento da denúncia feita por um grupo de estudantes do curso de Letras, que relatou falta de condições de utilização do novo campus central da universidade em Porto Alegre e defasagem no quadro de servidores.

Com mais de 20 anos de existência, a UERGS conta com 49 cursos de graduação, 22 de especialização e cinco de mestrado, em 24 unidades em diferentes municípios de todo o estado. A comunidade escolar se mobilizou fortemente para participar da audiência pública e reivindicar maior valorização por parte do governo com a universidade, que abriga mais de 5 mil alunos na graduação e 1 mil na pós-graduação.

A audiência contou com a presença do reitor da universidade, Leonardo Beroldt, assim como do pró-reitor Gabriel Borges da Cunha e de diversos docentes, mas a Secretaria Estadual de Inovação, Ciência e Tecnologia, responsável pela instituição, não enviou representantes. A deputada Luciana Genro vem acompanhando a situação da UERGS após receber denúncias por parte dos estudantes a respeito da falta de condições do novo campus central, localizado no antigo espaço da Cientec.

Audiência pública foi realizada na Sala Adão Pretto e contou com a presença de estudantes, professores e funcionários. Foto: Celso Bender/ Agência ALRS

“Essa audiência foi solicitada pelos estudantes, que nos relataram as dificuldades que têm tido para retomar as aulas presenciais após tanto tempo de pandemia. Sabemos que a conquista do novo campus foi muito importante, e agora estas dificuldades de infraestrutura precisam ser debatidas e superadas”, apontou a parlamentar. No final de abril, um movimento iniciado pelos alunos do curso de Letras denunciou que as obras previstas para os prédios que irão abrigar o campus ainda não haviam sido iniciadas e que os materiais escolares, como cadeiras e mesas, estavam amontoados em salas.

Para além dos problemas estruturais, diversas outras questões foram levantadas pela comunidade escolar. “A instituição nunca conseguiu manter corpo docente completo. Funcionários e professores têm feito malabarismos para manter os cursos e percebemos que muitas dificuldades poderiam ser evitadas se houvesse maior diálogo com o governo”, colocou Vitória Leonora Viegas, estudante de Letras. Os planos de reformas também não foram vistos com segurança pelos estudantes e diversos trâmites têm atrasado as obras necessárias.

O representante discente no Consun, Ederson Ferreira, apontou que a UERGS possui o menor orçamento de universidade estadual no país. “Precisamos de reposição de 53 pessoas na universidade, desde docentes até técnicos-administrativos. 0,5% do orçamento líquido do estado é um direito nosso”, colocou. A estudante Camila Padilha acrescentou que, além da falta de funcionários, os estudantes também vêm cobrando assistência estudantil. “Não temos aulas presenciais, estamos trabalhando com pouquíssimos docentes que têm se virado pra cumprir nossas necessidades. É direito nosso ter um local para estudar”, complementou.

Estudantes Camila, Leonora e Ederson relataram luta por mais funcionários, professores e estrutura.

O orçamento da universidade está há oito anos sem aumentos, desde o governo de José Ivo Sartori, conforme denunciou o professor Robson Evaldo Bohrer. “Está mais do que na hora do Executivo e Legislativo olharem de verdade para a universidade e enviarem recursos. Nós trabalhamos para que sejam efetivados mais concursos para docentes e funcionários. O teto seria 600 professores e hoje em dia não chega nem na metade”, relatou.

Dentre os problemas no novo campus está o fato de que alguns dos locais onde estão previstas as aulas estão ocupados com outras atividades. “O espaço foi transferido há quase um ano, mas falta concluir a etapa de adequação do local e para isso precisamos que se iniciem as obras. Governantes precisam investir e parar com o desmonte e sucateamento da universidade”, afirmou Bárbara Amorim, representante dos servidores e diretora do Semapi. Ela também pediu apoio ao pleito de que os ex-funcionários da agora extinta Cientec, que estão espalhados em diversas secretarias, possam se somar ao quadro da UERGS.

Servidora Bárbara Amorim (à direita, com o microfone) pediu investimento por parte dos governantes Foto: Celso Bender/ Agência ALRS.

A analista-administrativa Gabriela Castro, que representou a ASSUERGS, contou que a associação e o Semapi visitaram o local no dia 16 de maio e relataram que não há condições do espaço receber turmas no momento. A universidade ainda aguarda aprovação do projeto para as reformas. “Estamos acompanhando os esforços para inícios das obras de forma a deixar em perfeitas condições de uso. Entendemos que a universidade está passando por um momento histórico com a cedência desse novo campus”, colocou.

Reitor: “Falta de recursos humanos não é de hoje”

O Reitor da universidade, Leonardo Beroldt, afirmou que a falta de recursos humanos é um problema histórico da UERGS. “Deveríamos ter 600 professores, 390 pessoal de apoio técnico-administrativo e nunca atingimos 50% de nenhum deles. A falta de recursos humanos não é de hoje”, destacou. Ele argumentou que a falta de aulas presenciais ocorreu inicialmente devido à pandemia e que a instituição foi a primeira universidade pública do estado a iniciar as aulas em ensino remoto. Há diversos obstáculos para o retorno das atividades presenciais, pois das 23 unidades, menos da metade possui espaços próprios. Muitas delas não têm condições sanitárias para o retorno.

“Em 2019, iniciamos tratativas com o governo para uma sede. Com a extinção da Cientec, o Ministério Público colocou como condição a destinação dos imóveis e dos bens móveis para a universidade. Obtivemos o termo de cessão de uso do prédio 4 da Cientec em junho e o restante em setembro. Daí que conseguimos adentrar com equipe técnica para levantar a situação. Estava há seis anos fechado, então tinha que avaliar as condições”, relatou, acrescentando que o espaço não tinha estrutura de ensino e salas de aula.

Reitor Leonardo Berolt relatou que falta de pessoal é um problema histórico da UERGS.

A universidade conta com apenas duas engenheiras e duas arquitetas para elaborar o projeto. Sobre o mobiliário estar já no local, Beroldt argumentou que o governo precisava realocar os serviços de segurança para o antigo campus da UERGS, no bairro Agronomia, após o incêndio na Secretaria de Segurança Pública. Ele ainda pediu que o Parlamento se atente à destinação de emendas para a universidade, mas destacou que é preciso que haja pessoal para gerir os recursos.

Mais depoimentos de alunos e professores

Após as falas dos convidados, a palavra foi aberta para os demais presentes, que encheram a sala Adão Pretto, no térreo da Assembleia Legislativa, demonstrando uma forte mobilização por parte da comunidade escolar. O ex-reitor da instituição, Fernando Guaranha, se fez presente e relatou que a situação se estende ao longo dos anos. “Em 2014, tínhamos 256 professores, com o orçamento igual ao deste ano. Está congelado há 8 anos e o número de professores diminuiu porque o governo se nega a fazer concurso, enquanto o número de alunos praticamente dobrou”, relatou.

O professor Luciano Andreatta afirmou que os docentes estão indignados com a falta de pessoal e de orçamento, assunto que foi abordado também pelo professor Gilmar Azevedo. “A UERGS foi criada para a classe trabalhadora. Fomos jogados nos cantos de escolas, estruturas permanentes ainda não aconteceram. É um absurdo, não estamos pedindo nada além do que é direito daqueles que estudam lá”, colocou, afirmando estar muito orgulhoso dos estudantes pela mobilização.

Participantes relataram que orçamento da instituição está congelado há oito anos. Foto: Celso Bender/ Agência ALRS

O professor Elizandro Max Borba trouxe uma comparação com os demais estados do Sul do país para questionar a falta de investimentos na universidade. “Em Santa Catarina, eles têm garantido por lei 2,49% pra Udesc. A gente aqui está tentando chegar em 0,5%. No Paraná são sete universidades estaduais com mil professores cada. A gente aqui tentando chegar em 600”, afirmou. O estudante angolano Selton trouxe seu depoimento e relatou o quanto os professores e funcionários têm sido fundamentais para que ele conseguisse seguir estudando durante a pandemia.

Encaminhamentos

A deputada Luciana Genro e a deputada Sofia Cavedon, que também se fez presente na audiência, fizeram sugestões de encaminhamentos após ouvirem a comunidade escolar. A visita ao campus central, que já havia sido marcada e precisou ser cancelada, será remarcada pela Comissão de Educação. Elas observaram que alguns dos problemas relatados pela UERGS se repetem também nas escolas de nível básico. “Nós vemos escolas estaduais que inclusive perderam dinheiro federal porque não tem engenheiro para fazer projeto”, lamentou Luciana Genro.

A parlamentar explicou que o papel do Legislativo é fiscalizar e cobrar, mas problemas como a falta de funcionários, de concurso, de engenheiros para fazer projetos são de responsabilidade do Executivo. “O que podemos fazer aqui é somar esforços com a reitoria e os estudantes. Precisamos aprofundar essa pressão para que o governo tome as providências necessárias”, colocou. Dentre os encaminhamentos, ficou definida a proposta de uma reunião com o secretário de Ciência e Tecnologia, a sugestão da criação de um abaixo-assinado virtual para angariar apoio da sociedade gaúcha para as reivindicações e a realização de uma exposição sobre a universidade.

Luciana Genro também garantiu que a Comissão de Educação irá ficar atenta para reforçar a mobilização quando for enviada à Assembleia a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que prevê os recursos a serem destinados para a universidade, para que se reforce a mobilização e seja cumprido o que está no orçamento.