joesley
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*Artigo da escritora Tati Bernardi, originalmente publicado na Folha de São Paulo em 26/05/2017.

Compra de silêncio com obesas mesadas, superfaturamentos, patrocínio fraudulento de campanhas políticas, contas no exterior, encontro com o presidente na calada da noite, grosserias de um político coxinha narradas por um âncora almofadinha. Nada disso me soa mais patético e/ou escandaloso do que a história dos irmãos, Joesley e Wesley, que superaram a expectativa nominal de dupla sertaneja e decidiram leiloar o próprio país. Joesley fez mais do que cuspir na louça refinada em que comeu, ele mandou explodir a fábrica de pratos que já alimentou não apenas suas próximas dez gerações, mas os reis na barriga de muitos colegas. Se fosse uma ficção científica (e não é?), veríamos ele e sua família correndo para embarcar num jato particular enquanto destroços e labaredas raivosas não os atingem por meio segundo.

Apaixonado, com a intensidade e o exagero que somente os feiosos rejeitados do colégio podem sentir em vida adulta, celebrou seu casamento em três diferentes países, gastando cifras ainda maiores do que as relatadas (como se nada fossem) à Procuradoria-Geral. Rebento insaciável, mamou num BNDES duvidoso e, no meio da fartura, muito antes de ser o “geniopata” mais famoso do Brasil, tentou mudar a JBS para a Irlanda, paraíso fiscal. Psicopata boa praça, se mostrou sempre calmo e risonho, tanto ao grampear os comparsas quanto ao ser filmado expondo a lama que o encobriu. Maroto e bem assessorado, reza a lenda que espalhava carne barata pelo país, para abaixar o valor do boi. Qualquer semelhança nossa com seus gados não é mera coincidência.

E a sacanagem não para por aí. Foi visto, provavelmente enquanto planejava rifar sua nação como se fôssemos brinquedos vagabundos de quermesse, comprando mimos sexuais em NY com a sua belíssima cônjuge “jornalista premiada” que, em uma entrevista recente, quis falar “nesse meio tempo” e falou “nesse meio termo”. A riqueza, pelo visto, traz mais do que a falta de preocupação com a gasolina. Seria seu bolo preferido o de dinheiro?

Lembra na época da ditadura, quando jovens eram violentados porque não entregavam os amiguinhos? Pois é, na delação premiada, tiozinhos são ostentados justamente por expor, grampear e cagar na cabeça dos camaradas. Nossas paredes estão forradas de cartazes “traga-nos a cabeça da República e ganhe uma vida livre e nababesca”. Saudade de quando eram grafites. Saudade da época do colégio, quando eu achava que “leniência” tinha a ver com Lênin, o Vladimir. Ao saber do mandado de prisão do Maluf, senti nostalgia. Queria ter um Alf de pelúcia, um Pense Bem e um boneco de pano “Malufinho rouba, mas faz”. Vendo em retrospecto, alguns bandidos da nossa infância chegam a ser fofos.

E agora, pós fuga lícita de Joesley, nós, pobres e moídos civis orgulhosos de declarar impostos e misturar uma carninha fraca no arroz, ficamos aqui nos perguntando quem são, onde vivem e do que se alimentam os juízes que mandaram prender os trutas carregadores de malas e não os tubarões que as confeccionaram com o couro arrancado de um país inteiro. A lição que fica, diariamente, é que se você for um merda, mas dedurar o bosta, estará livre para nunca mais voltar pro esgoto. Livre para recarregar dildos de última geração em uma cobertura na Quinta Avenida. Ou para rir com o vídeo desesperado do Aécio que, assim como quase toda atriz pornô ou participante de BBB, só queria comprar (ou vender?) uma casa para a pobre mãe.