Jornal do Comércio, 13 de setembro de 2010
Jornal do Comércio, 13 de setembro de 2010

| Saiu na Imprensa

Frases & Personagens

“As mudanças no trânsito da Ramiro Barcellos foram positivas para o tráfego, mas ameaçam a segurança de pedestres. As sinaleiras não são sincronizadas, faltam faixas de segurança e não há equipamentos para conter a velocidade dos veículos. Hoje, como está, a Ramiro é de alto risco.” Pedro Ruas, vereador/P-Sol.

Plínio defende ampla reforma agrária em todo o País

“Toda terra com mais de mil hectares vai ser desapropriada e entregue à massa rural” MARCELO G. RIBEIRO/JC

Se for eleito presidente da República, o candidato do P-Sol Plínio de Arruda Sampaio vai priorizar a execução de uma reforma agrária em todo o território nacional. A intenção do socialista é desapropriar as propriedades rurais com mais de mil hectares para criação de assentamentos, para reduzir a pobreza e estimular a agricultura familiar.

“É a coisa mais fundamental a ser feita no Brasil. Porque a pobreza nasce aí”, avalia. O presidenciável considera que o País pode desapropriar as terras sem prejuízo às exportações. Para Plínio, a própria capacidade produtiva da pequena propriedade pode gerar um excedente exportável.

Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Plínio fala sobre os projetos que pretende implantar no Brasil e os principais pontos de sua política de governo.

Jornal do Comércio – Qual é o programa de governo do P-Sol para o País?

Plínio de Arruda Sampaio – Um programa de compromisso com a igualdade social. A marca é a luta contra a desigualdade. Há uma espécie de muro que impede o povo de participar, de realizar as suas aspirações. É uma muralha que vamos romper, com proposições. Então, é um programa descentralizador da renda, porque esse muro da desigualdade tem como fundamento principal a questão econômica. Mas não é só isso, é social e cultural também. Porque tem preconceito contra o negro, contra pessoas de preferência sexual distinta, preconceitos de toda a ordem.

JC – Mas qual é o ponto prioritário nesse momento?

Plínio – Reforma agrária. É a coisa mais fundamental a ser feita. Porque a pobreza nasce ali. Toda terra com mais de mil hectares vai ser desapropriada e entregue à massa rural.

JC – Não haverá agronegócio para exportação?

Plínio – Vai haver excedente para a exportação. Sempre haverá, porque o Brasil tem uma capacidade de produção agrícola enorme. Então, pode, sem prejudicar o abastecimento interno, ter uma quantidade exportável grande. Não necessitamos de tantas divisas externas, porque podemos ter um desenvolvimento baseado nos elementos internos que já temos e na capacidade produtiva.

JC – Mas como isso se dará de forma prática? Haveria uma forte reação contra a limitação da propriedade rural.

Plínio – Se o P-Sol for governo, é a prova de que a relação de forças mudou. Então, vai-se utilizar essa relação de forças de pressão da opinião pública, democraticamente, para conseguir que o Congresso aprove uma legislação que permita ao governo distribuir tudo que é terra acima de mil hectares, que é a proposta da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). Não tem nada de radicalismo nisso. Os bispos do Brasil estão pedindo.

JC – Na questão do trabalho, quais as suas propostas?

Plínio – Quebrar a desigualdade urbana, através da redução da jornada de trabalho sem redução de salário. Se dobrar a força de trabalho empregada, não precisa de tantas horas de trabalho. O ser humano não precisa trabalhar oito horas. Onde está escrito isso? É para servir ao capital. O ser humano não é escravo do capital, é sujeito da própria vida, precisa ter tempo para estudar, ler, ouvir música, ficar com os filhos, a mulher, cuidar do pai.

JC – E na educação?

Plínio – Há um problema de igualdade. Tem uma criança de sete anos que vai para uma escola ruim, e outra de sete anos que vai para uma ótima. A primeira é pública, a segunda, particular. Quando eles se encontram, aos 20 anos, para disputar uma vaga na universidade ou um emprego, qual vai ter o emprego bom? Qual vai para a universidade pública, que é barata e boa? É o menino rico, o que é injusto. É uma perpetuação da desigualdade.

JC – O que pode ser feito para mudar isso?

Plínio – Dar dinheiro público só para escola pública. Com isso, ela vai ficar boa. E quando a rede pública for boa, vai esvaziar a escola privada.

JC – Setores que temiam o governo Lula (PT) hoje elogiam o fato de ele ter mantido a política econômica de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Como seria a política econômica do seu governo?

Plínio – Diametralmente oposta. O primeiro passo será uma auditoria da dívida pública. O deputado (federal) Ivan Valente (P-Sol) tem levantado essa questão no Congresso. E a sua assessora principal é auditora da Fazenda Federal. Ela fez uma assessoria para o governo do Equador, para discutir o que é dívida e o que não é, e reduziu 40% da dívida só descobrindo créditos que não eram reais. Então, vamos primeiro pedir auditoria. Expurgado o débito falso, vamos pegar aquela quantidade que sobrou e negociar com os credores maiores o prolongamento do tempo. Só com isso podemos duplicar, no primeiro ano, o orçamento da educação, que é 13%, e o da saúde, que é 5%. Hoje gastamos 30% só no pagamento dos títulos da dívida pública. Diminuindo isso, temos dinheiro para o resto. É o começo da política econômica.

JC – E a autonomia do Banco Central será mantida?

Plínio – De jeito nenhum. Não se pode pôr a cabra para cuidar da horta. O Banco Central tem que ser subordinado ao ministro da Fazenda. Isso é uma diretriz clara no programa do P-Sol.

JC – Qual será o tratamento dado aos programas sociais que existem no atual governo?

Plínio – Vamos ampliá-los bastante, mas manter o caráter de programa emergencial que eles perderam. Não vamos criar pessoas dependentes.

JC – Como será sua plataforma para a segurança pública?

Plínio – Segurança é resultado de três variáveis: emprego, educação e saúde. Restam os grupos que já estão no crime. Esses têm que ser combatidos. Mas não com mais armas, radiopatruha, violência. Não. Com mais civilidade. Nossa proposta é reeducar as polícias. A polícia hoje faz incursões no crime, entra violentamente e mata quem estiver pela frente. É preciso estar no posto policial, que deve ser subordinado ao controle da comunidade.

JC – E a política externa do seu governo, como será?

Plínio – Precisamos de uma diplomacia competente para segurar os golpes, para se unir com os mais fracos. Essa ideia de que o Brasil resolveu as coisas no Irã e no Haiti é ilusória. Fomos até o Irã de graça, prestar um serviço ao (Barack) Obama (presidente dos Estados Unidos). Vamos fortalecer a relação com os países vizinhos, que comandam a rebeldia do povo latino-americano.

JC – Quais são as suas propostas para a saúde?

Plínio – Socializar a medicina e a atenção à saúde, que compreende não só o atendimento médico, mas a produção de remédios. Nos baseamos no modelo inglês, que permite que o doente não dependa de um plano de saúde para ser atendido. Isso é absurdo. Saúde não deve ser objeto de comércio.

JC – Um debate que será feito nos próximos anos é sobre a distribuição dos royalties do pré-sal. Nenhum estado quer perder a sua fatia…

Plínio – Isso é uma farsa. Estão forçando o povo brasileiro a uma decisão precoce, sobre uma coisa que ele não conhece. É uma incógnita. Por exemplo, qual é a repercussão de um vazamento de óleo a 7 mil metros? Segundo, quanto vai se gastar? Não há orçamento para isso, mas se fala em gastar bilhões. Vamos ter que pedir emprestado. Quem vai ser o dono desse petróleo? O credor que nos deu o dinheiro ou nós? Como vai ser essa negociação? Não se discutiu sequer a soberania do Brasil nesse território, que é contestada. Os EUA não aceitam. Então, a primeira coisa é um debate no Congresso para todas as variáveis virem à tona. Depois, se faz um plebiscito.

JC – Esse assunto remete à reforma tributária. Como concretizar uma divisão igualitária do bolo tributário?

Plínio – Tem uma choradeira dos empresários, que dizem que são muito taxados. Boa parte dos impostos que pagam são colocados nos preços das coisas. Quem paga é o consumidor. O imposto injusto no Brasil é o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). Quando o pobre compra um pãozinho, paga o mesmo imposto que o rico. Do ponto de vista do orçamento dele, aquela quantia, embora pequena, representa um percentual enorme. Isso deve ser mudado.

JC – O que mudar no ICMS?

Plínio – Primeiro vamos localizar o ICMS pelo destino, não pela produção. Isso vai permitir uma redução da alíquota, repercutindo na vida das pessoas.

JC – Outra reforma que precisa ser debatida é a política.

Plínio – É outra hipocrisia, porque a reforma política é feita pelos políticos, para beneficiar o grupo que está no poder no momento em que se faz a reforma. Toda vez que se discutiu no Congresso a reforma política, o grupo que comandava fazia cálculos para proibir o que prejudicava eles e permitir o que os facilitava. Isso não é reforma política. Reforma política se chama “financiamento público de campanha”, e não dinheiro para o candidato. O dinheiro deve ser dado ao tribunal eleitoral que, por sua vez, paga a despesa permitida ao candidato.

JC – Qual sua posição sobre o voto distrital em lista?

Plínio – Não sou favorável ao voto distrital, porque ele provincializa a eleição. O País precisa discutir os problemas nacionais. O voto distrital misto seria uma forma teoricamente melhor. Mas não é um assunto que eu dê prioridade. A prioridade é financiamento público de campanha.

JC – O P-Sol não tem uma grande base parlamentar no Congresso. Como seria a governabilidade no seu mandato?

Plínio – Não há necessidade disso. Supõe-se que um partido, ao chegar ao poder, conte com a maioria da população. Nossa vitória significará uma conscientização rápida do povo brasileiro. E nesse caso, é possível governar independentemente do tamanho da representação parlamentar. É possível usar a opinião pública para respaldar o governo. Não faremos mensalão, nem alianças fora do arco da esquerda – (composta, além do P-Sol por) PCB, PSTU e as organizações populares, como o MST.

JC – Quais são seus projetos para o Rio Grande do Sul?

Plínio – O Rio Grande sofre, como o Brasil, o processo da regressão neocolonial. Quando uma economia industrial mais poderosa é autônoma, depende mais do mercado interno. Quando é agrária, primária e exportadora, depende de preços fixados fora do Brasil. O Rio Grande tinha uma indústria, fez um desenvolvimento industrial médio extremamente bom. Essa indústria está sofrendo e vamos alterar isso. O segundo problema é titular as terras de forma correta. Aqui, o grilo foi monumental. Essa ideia de florestar o País e o Rio Grande é perigosíssima, porque florestamento é, na verdade, uma aversão à natureza.

JC – Mas a silvicultura é defendida na Metade Sul, região mais pobre que pode crescer com a cadeia econômica criada com as papeleiras.

Plínio – Existem formas muito mais eficazes, rápidas e mais conformes com a ecologia. Como a pequena agricultura, a produção de alimento com excedente exportável, através de uma pequena unidade. Isso é o que mais defende a natureza. A última estatística do IBGE demonstra isso. O maior retorno por capital investido é na pequena agricultura. É mais eficaz do que a grande.

JC – Como o senhor avalia a cobertura da mídia?

Plínio – Sou uma pessoa que não sai nos veículos de comunicação de massa de maneira alguma. É óbvio que assim não atinjo uma boa pontuação nas pesquisas. É uma demonstração do grau de democracia da mídia – é extremamente antidemocrática e uma ferramenta de opressão do povo, que libera o capitalismo da obrigação de manter uma tropa. Minha candidatura vai quebrar isso.
Perfil

Plínio Soares de Arruda Sampaio, 80 anos, é formado em Direito pela USP, com mestrado em Desenvolvimento Econômico Internacional pela Universidade de Cornell (EUA). Promotor público aposentado, iniciou a vida política no PDC (Partido Democrático Cristão). Depois, na ditadura militar, viveu doze anos no exílio, entre 1964 e 1976, período em que trabalhou para a Organização das Nações Unidas, coordenando projetos de reforma agrária em diversos países da América Latina. Na redemocratização, ajudou a fundar o Partido dos Trabalhadores (PT), cujo estatuto elaborou. Foi deputado federal por três mandatos (1963-64, pelo PDC; e 1987-1994, pelo PT) e subchefe da Casa Civil do governo paulista, entre 1959 e 1961. Tentou se eleger presidente nacional do PT por duas vezes, em 1998 e 2005, mas deixou o partido por discordar da política de alianças e entender que a legenda abandonou bandeiras históricas. Filiou-se ao Partido Socialismo e Liberdade (P-Sol) em 2005. É o candidato à presidência da República da sigla nestas eleições.