Luciana Genro
“Quero registrar esta análise de conjuntura elaborada pela bancada do PSOL.
Para garantir o pagamento da dívida, o governo concede mais privilégios tributários aos rentistas. No dia 13 de maio de 2009, o governo anunciou que irá reduzir de 22,5% para 15% o IR – Imposto de Renda sobre os ganhos dos investidores com títulos da dívida pública. Essa medida foi tomada para garantir o próprio pagamento da dívida, ou seja, garantir que o governo continue tomando empréstimos para pagar as amortizações e os juros que estão vencendo.
Importante ressaltar que, em 2006, já foi concedida isenção de IR para o ganho de estrangeiros em aplicações de títulos da dívida interna brasileira. Agora, o governo reduz o imposto para os brasileiros, aprofundando ainda mais uma estrutura tributária injusta e regressiva, na qual os mais ricos pouco pagam, enquanto os trabalhadores e consumidores financiam o Estado. A queda na arrecadação de IR também afetará estados e municípios, que têm direito à metade da arrecadação desse imposto, e que atravessam grave crise financeira com a queda dos repasses federais, tendo cortado gastos sociais fundamentais, como merenda escolar e despesas hospitalares.
Enquanto os municípios custam a obter ajuda limitada a R$ 1 bilhão do governo federal para recompor pequena parte das perdas para este ano (projetadas em R$ 8 bilhões), o governo não mede esforços em conceder grande benefício fiscal, estimado preliminarmente em R$ 3 bilhões por ano, para os rentistas. É um subsídio injusto, pois significa a transferência de recursos dos mais pobres para os mais ricos.
Essa medida do governo mostra, mais uma vez, que a dívida pública é o centro dos problemas nacionais, e que tem comandado as principais decisões de política econômica. Atualmente, o Imposto de Renda incidente sobre os ganhos dos brasileiros com a dívida interna (por meio dos Fundos de Investimento de Renda Fixa) varia de 15% a 22,5%, dependendo do prazo no qual os recursos permaneceram aplicados. Com a nova medida do governo, esse percentual máximo de 22,5% cai para 15%. Enquanto isso, os trabalhadores assalariados pagam até 27,5% de Imposto de Renda, o que é uma grande injustiça. Por exemplo: um rentista que ganhar R$ 1 milhão durante o ano com a dívida pública se sujeitará a uma alíquota máxima de 15%, enquanto um trabalhador que recebe salário superior à quantia de apenas R$ 3.582 por mês fica submetido a uma alíquota de 27,5%.
Atualmente, os fundos de investimento (controlados pelos bancos) cobram altas taxas de administração, razão pela qual a pequena queda da taxa Selic verificada nos últimos meses poderia levar os investidores a fugir desses fundos (que aplicam em títulos da dívida pública) e migrar para aplicações em poupança, o que provocaria dificuldades para a rolagem da dívida pública.
Diante dessa conjuntura, ao invés de suspender temporariamente o pagamento da dívida interna e auditá-la, ou de pelo menos obrigar os bancos a reduzirem suas taxas de administração dos fundos de investimento, o governo optou por reduzir o Imposto de Renda incidente sobre os ganhos com a dívida interna. Dessa forma, o governo garante a rolagem da dívida, mantendo os investidores nos fundos de investimento comprando títulos da dívida, e termina por atender aos anseios dos banqueiros, que jamais iriam querer uma massa de recursos aplicados na poupança, dos quais 65% têm de ser aplicados no setor produtivo (imobiliário).
O dia de 13 de maio não poderia ser mais contraditório para o anúncio dessa medida do governo. No dia da Abolição da Escravatura, o governo mostra que o país está, cada vez mais, escravo de uma dívida pública nunca auditada (ao contrário do que prevê a Constituição Federal) e que já alcança patamares elevadíssimos – somando-se as dívidas interna e a externa já superamos a casa dos R$ 2 trilhões -, condicionando completamente a política econômica atual e afetando profundamente a vida da sociedade brasileira.
Veto ao reajuste dos aposentados
No mesmo dia 13 de maio, deputados e senadores deveriam votar o veto do presidente Lula ao reajuste de 16,67% aos aposentados, concedido pelo Congresso em 2006. Como resultado do veto, o reajuste foi de apenas 5%. O ministro da Previdência afirmou que a concessão do reajuste de 16,67% ocasionaria um “rombo” de R$ 7 bilhões na Previdência Social, e assim o governo conseguiu adiar a votação, o que na prática fez com que fosse mantido o veto.
O que o governo não fala é que a Previdência está inserida na Seguridade Social, que apresentou superávit de mais de R$ 50 bilhões em 2008. A verdadeira razão pela qual o governo não concede tal reajuste é a contínua destinação dos recursos da Seguridade (por meio da Desvinculação das Receitas da União) para o cumprimento das metas de superávit primário, ou seja, a reserva de recursos para o pagamento da dívida.
Governo Lula quer usar reajustes de servidores como arma de campanha em 2010
O governo irá utilizar os reajustes concedidos aos servidores como trunfo eleitoral em 2010, na tentativa de se diferenciar dos adversários e dos que defendem redução nos gastos com pessoal. Ou seja: parece que o governo Lula estaria priorizando mais os gastos com os servidores do que o governo FHC e seus aliados. Porém, não é isso que indica o dado do próprio Ministério do Planejamento (Boletim de Pessoal), disponível na página www.servidor.gov.br/publicacao/boletim_estatistico/bol_estatistico_09/Bol154_Fev2009.pdf.
Olhando-se a página 26 desta publicação, observamos que o governo FHC iniciou seu mandato em 1995 gastando 56,2% de sua RCL – Receita Corrente Líquida com pessoal. Quando FHC deixou o Planalto, em 2002, esse percentual havia caído para 32,1%. Contrariando a sua intenção de mostrar comprometimento com os servidores, o governo Lula reduziu ainda mais esse percentual, para 27,3% em 2005. Em 2008, esse percentual atingiu 30,5% da RCL, ou seja, valor este mais baixo que o observado no pior ano de FHC. Se considerarmos o valor do gasto com pessoal como percentual do Produto Interno Bruto, o governo Lula também perde de FHC.
Em suma: o governo Lula manteve e até aprofundou a política de FHC. E qual é essa política? A política de arrocho em cima do servidor, para garantir os crescentes gastos com o endividamento.”