A deputada estadual Luciana Genro (PSOL) participou, nesta quarta-feira (22), de audiência pública da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos que debateu a situação da Casa de Apoio Viva Maria, abrigo protegido para mulheres vítimas de violência localizado em Porto Alegre. O local é gerido pela prefeitura, através da Secretaria Municipal de Saúde, e vem enfrentando uma série de dificuldades, conforme foi descrito na audiência.
“A Casa Viva Maria hoje enfrenta problemas com relação a recursos humanos. Conta com uma assistente social/coordenadora, que sou eu, duas psicólogas, sendo que uma tem carga horária de 20 horas, duas enfermeiras que há mais de um ano não estão atuando no serviço. O quadro é de seis monitores, hoje estamos com três”, relatou a coordenadora Saionara Santos. No momento, os profissionais trabalham com hora extra ou são chamados trabalhadores de fora quando necessário. Desde sua criação, a Viva Maria é lotada na Secretaria de Saúde, mas há previsão de troca de secretaria, embora a coordenadora ainda não saiba qual será o destino da Casa.
Em 2021, no período de pandemia, a Viva Maria atendeu 48 famílias, 119 pessoas, com uma média de permanência de 47 dias. “A média foi mais alta porque ficou muito mais difícil para elas conseguirem se organizar para sair devido à pandemia”, explicou Saionara. Em 2022, no primeiro período do ano já foram 36 famílias, 82 pessoas, com uma média de permanência de 26 dias. “Hoje, meu pedido é a garantia de sobrevivência da Casa de Apoio”, finalizou a coordenadora.
A importância de se seguir dando visibilidade ao problema da Casa Viva Maria, que não pode ser desestruturada por falta de recursos e investimentos, foi destacada por Luciana Genro. “Cabe a nós aqui, enquanto fiscalizadoras, garantir que haja orçamento e organização da rede pra que se existem vagas, elas sejam ofertadas e se busquem as adequações necessárias pra receber as mulheres que estão hoje aguardando no Palácio da Polícia”, disse.
A defensora pública Luciana Artus Schneider ressaltou a importância da Viva Maria e das casas de acolhimento em geral para que as mulheres escapem do ciclo de violência. “A importância da casa nesse sistema advém não só da questão de segurança. Nós vemos no plantão no Palácio da Polícia, onde a mulher é trazida no meio uma ocorrência, com os filhos, de madrugada, vemos que ela está num contexto de desabrigamento. E ela precisa ser acolhida pelo sistema, pela rede. O fluxo de atendimento da mulher passa fundamentalmente pela existência da casa de acolhimento”, narrou.
Nos últimos dez anos, foram 991 mulheres vítimas de feminicídios no Rio Grande do Sul, conforme dados da força-tarefa de combate aos feminicídios. No governo Leite as políticas para mulheres sofreram cortes orçamentários brutais: no primeiro ano, 2019, foram destinados apenas R$ 32 mil, 35% do que estava previsto no orçamento. Isso levou a deputada Luciana Genro a mobilizar a bancada feminina na Assembleia na apresentação de uma série de emendas em conjunto para elevar os valores previstos no orçamento estadual.
As políticas para mulheres apenas seguiram andando no estado graças a emendas destinadas por parlamentares, como a de Luciana Genro que permitiu convênio com uma organização social para garantir acolhimento de mulheres vítimas de violência doméstica. “A partir de emendas conseguimos melhorar esses números, mas ainda são insuficientes. A nível federal, ainda por cima, temos um discurso de ódio que fomenta a violência contra mulheres”, colocou Luciana Genro, citando o caso que recentemente causou revolta no país, da menina de 11 anos que engravidou após ser estuprada e foi tratada de forma violenta e intimidatória pelo Poder Judiciário.
O secretário municipal de Desenvolvimento Social, Leo Voigt, afirmou que a prefeitura está trabalhando para expandir a capacidade de acolhimento da casa. Além disso, garantiu que o poder público irá abrir uma casa que ficará aberta 24h por dia, 7 dias por semana, “funcionando como acolhimento para qualquer mulher em situação de abandono ou que precise de acolhimento”, que no momento está sendo conveniada.
A novidade foi detalhada por Fernanda Mendes, coordenadora dos Direitos da Mulher da SMDS, que afirmou que todos os esforços estão sendo voltados para isso. “Na nova casa de passagem, não vai ter limitações de idade pras crianças, vão ser 20 vagas para famílias – a princípio, o número ainda pode aumentar – e filhos de até 18 anos podem acompanhar as mães. Em agosto deve estar funcionando”, afirmou, agradecendo também à deputada Luciana Genro pela emenda destinada à Coordenadoria da Mulher, que permitiu a implantação de um programa que pretende fazer uma grande campanha de conscientização sobre violência contra mulher, que deve ser lançado em novembro.
A notícia foi recebida com otimismo na audiência, mas, ao mesmo tempo, há pressa para resolver as questões que são urgentes no momento. A delegada Cristiane Ramos, da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM) de Porto Alegre, relatou que há mulheres agora aguardando encaminhamento para abrigos, que a delegacia não tem para onde encaminhar.
“Há poucos dias, recebemos a notícia de que não receberiam mulheres depois das 18h. Conseguimos reverter, porque a maioria das mulheres que precisam chegam a nós de noite. Tivemos o caso de uma mulher em situação de rua que foi vítima de violência dentro do albergue municipal, pelo companheiro. A Viva Maria não poderia recebê-la por falta de assistente social, nos orientaram a entrar em contato com a FASC, que nos disse que não poderia ser acolhida e indicou então que ela fosse pra outro albergue e foi orientada a procurar o serviço em dia útil e horário comercial”, relatou.
Thaís Pereira Siqueira, do Levante Feminista, trouxe mais dados de feminicídios, relatando que são no mínimo 50 já no ano de 2022 no estado. Já Elisamar Rodrigues, Coordenadora do Fórum de Mulheres de Porto Alegre, apontou que os problemas da Casa Viva Maria não são de hoje. “Fui coordenadora-adjunta em 2018 e lá na época e já era um problema a questão de RH, a discussão de ficar na secretaria da Saúde ou na FASC”, colocou.
A audiência pública foi proposta pelos deputados Sofia Cavedon e Jeferson Fernandes, que encaminharam que sejam realizadas uma série de reuniões para seguir tratando do assunto: com o secretário Leo Voigt sobre o tema específico da Viva Maria, com a DEAM sobre a falta de pessoal e com a Famurs, para tratar dos centros de referência nos municípios. Os vereadores de Porto Alegre Laura Sito e Jonas Reis também participaram da audiência.