A partir de solicitação da deputada estadual Luciana Genro (PSOL), a Comissão de Segurança e Serviços Públicos da Assembleia Legislativa realizou nesta quinta-feira (17) uma audiência pública para tratar da PEC 32/2020, que aplica a reforma administrativa proposta pelo governo federal. A deputada destacou que essa não é uma questão que se resume aos servidores públicos, mas aos interesses da população em geral.
“A PEC 32 vem sendo apresentada como uma alternativa de enxugamento de gastos públicos e eficiência na prestação de serviços, mas isso é uma grande mentira. O Tribunal de Contas da União corroborou os números apresentados pela Auditoria Cidadão da Dívida e o grande problema da dívida pública não é o quadro funcional. Essa é uma proposta transforma uma política pública, que deveria servir à população, em fonte de lucro para empresas privadas,” denunciou Luciana Genro.
Vladimir Nepomuceno, Assessor da Frente Parlamentar Mista do Serviço Público, explicou que o grande problema são os juros da dívida pública e que o que se constata é uma intenção de aprovar, a toque de caixa, essa reforma que não é administrativa e vai piorar a estrutura do estado brasileiro.
“O que está sendo feito significa voltar 47 anos atrás, quando a ditadura militar tirou quase a totalidade do funcionalismo público da cobertura de um estatuto próprio, jogando todos para a CLT. Não vemos nada de moderno! Vamos ter saúde, educação para quem puder pagar. No momento que a população é afastada dos seus direitos, o servidor não poderá exercer suas funções como deveria e boa parte do dinheiro que deveria ser investido na estrutura do Estado, será direcionado para a iniciativa privada. Nossa função é esclarecer que ninguém está livre dessas mudanças, caso se concretizem. Atinge as três esferas, os três poderes e a população,” explicou Nepomuceno.
A coordenadora nacional da Auditoria Cidadã da Dívida Pública, Maria Lúcia Fattorelli, afirma que a PEC 32 é uma forma de garantir a terceirização e a privatização de forma generalizada para todas as categorias. Esclarece que o que onera os cofres públicos não é o funcionalismo, mas o gasto de mais de 40% do orçamento todo ano com os juros de uma dívida que já está paga.
“A proposta da PEC traz uma falsa alegação de que o problema das contas públicas estaria no gasto com os servidores e isso é mentira. Aqueles que recebem acima do teto, que estão no topo, membros de poder, estão fora da reforma. Mentem ao dizer que tem excesso de servidores, número que tem caído em termos gerais e em relação a população. Essa PEC coloca no horizonte o fim dos serviços públicos, gratuitos, universais, prestados de forma competente pelo funcionalismo,” explicou Maria Lúcia.
A deputada federal do PSOL, Fernanda Melchionna, pontuou a importância da mobilização dos servidores de forma a pressionar os deputados para que essa Emenda Constitucional não seja aprovada. Lembrou ainda que os ataques aos trabalhadores já vêm acontecendo há um certo tempo e a lógica da privatização permeia toda essa proposta.
“A PEC abre margem para que qualquer cargo da administração pública seja ocupado por cargo comissionado. Ela não só não faz economia, como a previsão do Senado é que pode resultar em gastos de até R$ 1 trilhão em cargos de confiança. Essa é a PEC da República Velha, da rachadinha, da corrupção, do desmonte do Estado brasileiro e da facilitação de negócios espúrios,” criticou Fernanda Melchionna.
Funcionalismo na luta
Espalhados pelos quatro cantos do Brasil, servidores de diversas entidades se fizeram presente na Audiência Pública e trouxeram suas demandas e preocupações frente à possibilidade de aprovação da PEC 32/2020. É perceptível a indignação e insatisfação das trabalhadoras e trabalhadores que enfrentam o desmonte e a desestruturação do serviço público, arcando com prejuízos que só tende a aumentar caso a PEC passe.
Ives Lucas, da Federação das Associações dos Servidores Públicos do RS, agradeceu o empenho da Comissão de Segurança e Serviços Públicos, bem como o empenho das parlamentares na luta e mobilização contra a PEC. Unadir Gonçalves Dias, presidente Febrafisco, ressaltou a necessidade de organização e mobilização dos servidores contra o que ele chamou de “nefasta PEC” e destacou que a federação tem participado de todos os espaços que possibilitam discutir e buscar combater a possibilidade de implementação da PEC já que todo o funcionalismo corre riscos.
Representando o Afocefe Sindicato, Altair Rech Ramos reafirmou que esse é um momento de dificuldade não somente para os servidores, como para toda a população, já que essa foi uma proposta feita de cima para baixo e não contempla nenhum setor senão o privatista. Para Filipe Costa Leiria, presidente da União Gaúcha em Defesa da Previdência Social, a Constituição vem sendo carcomida por baixo, ficando praticamente uma carcaça.
“Esse processo inicia com a Emenda do Teto dos Gastos, repercutindo na Reforma Trabalhista do setor privado e chegamos, agora, nessa proposta. No campo da previdência nós temos um olhar muito atento aos efeitos da PEC 32, em especial o fato dos regimes jurídicos serem colocados em extinção, trazendo uma série de aspectos negativos,” frisou Filipe.
Amauri Perusso, presidente da Federação das Entidades dos Servidores dos Tribunais de Contas, chamou a atenção para a dívida pública, apresentada como justificativa do governo para aprovar essa PEC. Amauri disse que as instituições públicas têm que assumir a verdade de que R$ 1 trilhão foi esterilizado de setores públicos para um setor que nada produz através do mecanismo da dívida pública.
Pela Associação das Defensoras e Defensores Públicos do RS, Maína Pech assegurou que mais do que preservar a Defensoria, instituição tão importante, é urgente preservar a educação, o SUS, os psicólogos que atendem pelo CAPS, a autonomia dos fiscais do meio ambiente, a liberdade da assistente social… “É uma luta por dignidade que atravessa essa proposta que vai atingir não só servidores, mas também os usuários destes serviços” realçou a defensora pública.
Aires Ribeiro, da Confederação Nacional dos Servidores Públicos Municipais, lembrou que o sucateamento do funcionalismo, diminuindo o Estado, vai na contramão das demandas da população, que estão aumentando, em especial na área da saúde, da educação e da segurança pública. Sabrina Oliveira Fernandes, do Sindicato dos Servidores da Procuradoria Geral do Estado, reafirmou que diante disso é mais do que necessária a mobilização do funcionalismo, mas também da comunidade, os usuários desta infinidade de serviços públicos que hoje é oferecida.
José Eduardo Rangel, da Fenale, acredita que a PEC 32 é um assassinato das classes menos favorecidas da nossa sociedade. Para ele a argumentação levantada como proposta do governo afeta a vida de toda a sociedade brasileira.
“Nós todos, que temos alguns anos como prestadores de serviço, estamos vendo que essas medidas têm um único objetivo: atender o mercado financeiro. Não há nenhuma preocupação com a sociedade. Acredito que a força e união de todos os segmentos que estão se reunindo, avaliando e analisando todos os malefícios dessa PEC, será capaz de sensibilizar os parlamentares, na certeza de que derrotaremos essas propostas. É preciso lutar por auxilio emergencial digno, gerar empregos, e não uma por uma reforma capenga como essa,” disse José.
Representando o CEAPE, Josué Martins afirma que o debate não se trata de uma questão corporativa, mas de uma reversão neocolonial da economia brasileira e também dos direitos, já que é um claro desmonte da Constituição pensada para avançar. “Ao desestruturar o Estado, impedindo que se controle o principal da riqueza, permite-se uma superexploração da economia e do trabalhador,” explica
Para Luis Fernando Alves da Silva, presidente da Associação dos Servidores da Justiça, agora era o momento de discutir pacto federativo, repartição das receitas nas devidas esferas do poder e não uma PEC como essa e destacou que o serviço público não foi deteriorado por completo porque tem servidores que tem como missão levar um trabalho de qualidade a população.
O Diretor do Sindifisco nacional, Marcos do Carmo Assunção, afirmou que essa proposta de Emenda Constitucional parece tentar desvincular o serviço público do servidor público, do trabalhador que garante o funcionamento de diversos setores e afirmou que ainda que essa reforma atendesse algum anseio, esse não seria o momento para discutir essa pauta.
Representando o Sintergs, Ângela Antunes lembrou que o sindicato tem um papel fundamental nas mobilizações para conscientização da sociedade, bem como no trabalho de base, unificando as ações que podem derrubar a PEC 32/2020. Sugeriu, ainda a construção de uma frente ampla de entidades para massificar a campanha contra mais esse ataque ao funcionalismo.
Fabiano Salazar, do Sindjus RS, assinalou que se a reforma passar tudo vai piorar. Que o acesso à saúde, educação, segurança, justiça e a entrega de direitos a todos os brasileiros será duramente impactado e que a PEC 32 representa o desmonte do estado social que foi adquirido a duras penas na Constituição de 88 e vem se deteriorando.
O presidente da Confederação Nacional das Carreiras e Atividades Típicas Do Estado, Antônio Carlos Fernandes Junior, lembrou que o tema também precisa estar presente nas câmaras dos municípios, para ampliar o debate e fortalecer a luta contra essa PEC.
Gaspar Bissolotti Neto, presidente da Associação e do Sindicato dos Servidores Aposentados e Pensionistas da Assembleia Legislativa do estado de São Paulo, lembrou que os aposentados também serão duramente atingidos por essa proposta, caso venha a se consolidar.
Berna Menezes, em fala pela Intersindical, lembrou que caso essa reforma seja aprovada, a luta política pelos direitos dos trabalhadores e também pelas melhorias do serviço público estará com os dias contados. Trouxe como exemplo a perseguição política vivida pelo técnico administrativo e sindicalista Rui Muniz, que também estava na audiência e reiterou a necessidade de barrar essa tentativa de reforma que vai desmontar, ainda mais, o serviço público.
Em nome do Assufrgs Sindicato, Rui Muniz agradeceu o espaço de trazer a debate a construção para que se consiga enfrentar e derrotar esses projetos que estão destruindo as funções públicas do estado brasileiro. “Não é possível que a gente continue admitindo não só o extermínio do estado, como também do povo, com a miséria crescente, o desemprego. A pandemia pode matar, mas isso é um assassinato fomentado por esse governo. O que está acontecendo na UFRGS hoje se sustenta nessas ações de autoritarismo e rompimento com a democracia”, finalizou o sindicalista.