Foto: Tânia Rego/ Agência Brasil
Foto: Tânia Rego/ Agência Brasil

| Saúde

A partir de uma demanda vinda da comunidade celíaca (pessoas que têm uma reação imunológica ao consumo de glúten), a deputada estadual Luciana Genro (PSOL) protocolou na Assembleia Legislativa o projeto de lei 72/2021, que determina que mercados e estabelecimentos similares com mais de cinco caixas registradoras tenham uma área específica e sinalizada com os produtos destinados aos indivíduos celíacos, diabéticos, com intolerância à lactose, vegetarianos e veganos.

“É uma simples medida para amenizar as dificuldades enfrentadas por essas populações em crescimento. Uma determinação sem custos e de fácil cumprimento; um movimento empático para ajudar milhões de gaúchos na tarefa cotidiana de comprar seus alimentos”, afirma a deputada na justificativa do projeto. A proposta determina que os estabelecimentos devem disponibilizar para estes produtos um espaço que pode ser “um setor, um corredor, uma gôndola, uma prateleira, um quiosque ou algum espaço diverso que corresponda a formas análogas de setorização” .

Quem entrou em contato com a deputada para levar esta demanda foi Izabel Vieira, professora e integrante do grupo Viver Sem Glúten Alegrete. Ela foi diagnosticada com doença celíaca há dois anos e vem sofrendo com as contaminações cruzadas. O glúten é a proteína encontrada em cereais como o trigo, o centeio, a cevada e o malte, o que significa que a população celíaca não pode consumir nada com estes componentes. “No início eu achava que era bobagem separar os produtos, mas já me contaminei três vezes e a mais recente foi muito forte. Alterou minha glicose, a minha pressão, e é bem complicado, pode até evoluir para câncer se não eliminarmos completamente o glúten”, afirma a professora.

O supermercado local Baklizi adotou a prateleira exclusiva para produtos sem glúten | Foto: Viver Sem Glúten

Izabel explica os perigos das contaminações em mercados, relatando que os pacotes podem ser contaminados e até mesmo um produto com um pequeno furo ou uma embalagem mal fechada pode acarretar problemas para os celíacos. “A gente propôs para a Luciana esse PL porque isso nos ajudaria muito, seria fundamental os nossos produtos estarem em um local separado”, afirma Izabel. Os celíacos precisam ainda prestar atenção à presença do glúten nas diversas esferas, incluindo em medicamentos. Um supermercado da região inclusive já adotou a iniciativa de separar os produtos sem glúten em seu espaço, a partir de solicitação feita pelo grupo Viver Sem Glúten.

No entanto, o grupo lamenta que este tenha sido o único estabelecimento da região que atendeu a demanda, conforme explica a fundadora do Viver Sem Glúten, Carine Jardim. “Fizemos reuniões, solicitamos essa mudança e não fomos atendidas pela maioria das empresas. Exigimos apenas uma simples gôndola separada para nossas massas, pães. Em uma das empresas, o pão sem glúten, mesmo na embalagem, está junto da padaria. Então ele está sendo contaminado, isso para a nossa saúde é muito ruim”, afirma ela, que recentemente esteve hospitalizada com problemas renais devido ao consumo de glúten.

Carine e Izabel relatam que mesmo nos casos em que os produtos sejam transportados juntos até o supermercado, é muito importante e necessário para os celíacos separá-los nas prateleiras, pois isso reduz as possibilidades de contaminação. “Todas essas etapas permitem que o alimento tenha uma contaminação cruzada, mesmo que de forma quase imperceptível, em micro furos na embalagem. Quanto mais esse alimento estiver exposto à contaminação, mais aumentam esses níveis de contaminação”, aponta Carine. A mudança, que para os mercados pode parecer pequena, representaria mais qualidade de vida e um cuidado com a saúde para os celíacos.

O projeto de Luciana Genro também tem como base a Lei Estadual n° 19.499/2018, do Paraná, que impõe aos mercados e estabelecimentos similares o dever de disponibilizar em local único e específico os produtos destinados aos indivíduos celíacos, diabéticos, com intolerância à lactose, vegetarianos e veganos.

As integrantes do grupo Viver Sem Glúten Alegrete elaboraram um documento com sugestões de boas práticas voltadas a pessoas celíacas. Foto: Izabel Vieira/ Arquivo Pessoal

A restrição alimentar é um obstáculo enfrentado por milhões de pessoas no mundo. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), 1% da população padece com a doença que restringe o consumo de glúten. No Brasil, estudos apontam que há em torno de 2 milhões de pessoas afetadas pela doença. Já o diabetes afeta cerca de 460 milhões de adultos em todo o mundo. No Brasil, 11,4% dos adultos sofrem com a glicemia alta. A intolerância à lactose, outra comorbidade abordada neste projeto, é um distúrbio digestivo já sentido por cerca de 53 milhões de brasileiros.

Outros dois grupos de pessoas com restrições alimentares, contemplados por este projeto, são os vegetarianos e veganos. Geralmente são pessoas que optam por excluir alimentos de origem animal de seu cardápio, seja em busca de uma alimentação mais saudável, sustentável e até mesmo ética. De acordo com uma pesquisa, realizada pelo IBOPE em 2018, quase 30 milhões de brasileiros, ou seja, 14% da população, declararam adeptos a esta opção alimentar – um número maior do que as populações de toda a Austrália e Nova Zelândia juntas.

Confira a íntegra do PL:

Projeto de Lei n.º 72/2021
Deputada Luciana Genro


Obriga os mercados e estabelecimentos
similares a disponibilizar em local único e
específico os produtos destinados aos
indivíduos celíacos, diabéticos, com
intolerância à lactose, vegetarianos e veganos.

Art. 1º. Os mercados e estabelecimentos similares que comercializam produtos alimentícios e que mantêm mais de cinco caixas registradoras para atendimento aos consumidores, estejam elas ou não em funcionamento concomitante, ficam obrigados a disponibilizar em local único e específico os produtos destinados a indivíduos celíacos, diabéticos, com intolerância à lactose, vegetarianos e veganos.

§ 1º. Para fins desta Lei, considera-se:
I – local único e específico: aquele designado exclusivamente para a oferta dos produtos de que trata esta Lei, sendo um setor, um corredor, uma gôndola, uma prateleira, um quiosque ou algum espaço diverso que corresponda a formas análogas de setorização do estabelecimento;
II – produto alimentício destinado a indivíduos:
a) celíacos: aqueles elaborados sem adição de glúten;
b) diabéticos: aqueles elaborados sem adição de açúcar;
c) com intolerância à lactose: aqueles elaborados sem lactose ou com ingredientes destinados a atenuar os problemas decorrentes da deficiência total ou parcial na produção da enzima lactase pelo organismo;
d) vegetarianos: aqueles que dispensam carne, embora tradicionalmente a possuam em sua composição;
e) veganos: aqueles que dispensam quaisquer ingredientes de origem animal (como carne, ovos, mel, leite e seus derivados), embora tradicionalmente os possuam em sua composição.

§ 2º. Os produtos light e diet, ainda que acomodados no mesmo setor, devem ser dispostos separadamente com indicação clara e destacada para cada tipo de produto.

Art. 2º. As empresas abrangidas por esta Lei terão o prazo de 180 (cento e oitenta) dias, contados a partir da data de sua publicação, para promover as adequações necessárias de seus produtos.

Art. 3º. A infração às disposições da presente Lei acarretará aos responsáveis a imposição de multa no valor de 5 UPF-RS (cinco Unidades Padrão Fiscal do Rio Grande do Sul) a 250 UPF-RS (duzentas e cinquenta), dobrada em caso de reincidência em um período inferior a um ano, observadas a gravidade da infração, o porte econômico do infrator, a sua conduta e o resultado produzido, de acordo com os critérios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Art. 4º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Sala das Sessões, 07 de abril de 2021.
Deputada Luciana Genro.