*Texto do escritor Luis Fernando Veríssimo, originalmente publicado em 02/05/2019 no site do jornal O Estado de São Paulo.
O fato do Pedro Sánchez ter pinta de galã ajudou, mas com qualquer outra cara a vitória do socialismo nas recentes eleições espanholas teria sido bem-vinda, e surpreendente. O esperado era que a questão dos imigrantes dominasse a votação e reforçasse a direita e a extrema direita, como tem acontecido em toda a Europa. A questão nem pintou. Pelo menos na Espanha, a preocupação com a invasão dos ilegais existiu, mas não decidiu. A direita cresceu, mas passou a valer politicamente apenas como massa de manobra contra a esquerda no poder – ultradireitistas, direitistas, conservadores tradicionais e separatistas unidos para incomodar.
O socialismo não triunfou na Espanha. “Triunfar” é uma palavra, assim, triunfante demais, que talvez não dure até a próxima eleição. Mas um vislumbre de socialismo já serve, principalmente a quem se resignara a nunca mais vê-lo em público, em companhia respeitável. Nos Estados Unidos a palavra tem aparecido no discurso político com uma frequência inédita, ultimamente. Durante muito tempo a Angela Davis (lembra dela?) era lançada como a única candidata esquerdista de verdade nas eleições presidenciais americanas. Diziam que o Partido Comunista dos Estados Unidos era mantido vivo apenas para manter viva a candidatura da Angela. Também diziam que o próprio partido era sustentado pelos agentes do FBI infiltrados, facilmente identificáveis porque eram os únicos que pagavam suas mesadas em dia. Mas acho que nem a Angela usava a palavra “socialismo”.
Bernie Sanders, o velhinho que tem concorrido nas últimas eleições presidenciais americanas, se identifica como socialista. Alexandria Ocasio-Cortez, o mais novo fenômeno eleitoral americano, representante do Bronx no Congresso, onde abafa todo mundo com sua inteligência aguda e já está sendo lembrada como candidata à presidência, se identifica como socialista. Marielle presente.