Por Luciana Genro
O retrato da crise do Brasil é termos tido uma sessão histórica do Congresso Nacional presidida por um bandido de colarinho branco, um gângster, como se referiu a ele durante a votação o nosso combativo deputado Glauber Braga. Isso diz tudo sobre este Congresso.
O governo perdeu com os votos de todos os seus aliados de ontem, agora pelo impeachment. Do PP, partido recordista na Lava Jato, e com os votos do PSB, além, é claro, do PMDB, que articulou tudo sob o comando de Michel Temer, vice de Dilma durante 6 anos.
Fui durante anos, desde o início, oposição aos governos do PT. A opção petista de governar com a burguesia não poderia ser apoiada por quem assumia uma posição verdadeiramente de esquerda. Muitos lutadores, pessoas honestas e trabalhadoras não apoiaram o caminho que escolhi de construir outro partido, no caso, o PSOL. Muitos não quiseram mudar de partido apostando que o PT, construído com sangue, suor e lágrimas de trabalhadores, ativistas e lideranças, continuaria sendo de esquerda e mudaria o Brasil. Não foi o que ocorreu.
O que se viu ao longo da experiência dos governos petistas foi a transformação do PT em seu contrário. De Partido dos Trabalhadores passou cada vez mais a ser um partido comandado por burocratas que aceitaram gerenciar os interesses capitalistas. A lucrativa amizade de Lula com os empreiteiros é uma prova disso. As medidas sociais limitadas que foram tomadas funcionaram como uma compensação para os ganhos enormes que foram garantidos para empreiteiras, banqueiros e grandes empresários. E esta aliança com a burguesia se manteve até o momento em que a maioria da burguesia decidiu romper com o PT.
Agora, 13 anos depois, o PT vai deixar o governo de modo desmoralizante, permitindo que um Congresso Nacional comandado por um bandido como Eduardo Cunha seja o lugar de decisão sobre o futuro governo do Brasil. O PT e seu governo, que aceitou reproduzir as mesmas alianças espúrias e os mesmos esquemas de corrupção que um dia denunciou, perdeu para os que são também profissionais destes esquemas.
O Congresso Nacional definiu o que para mim estava claro que faria: aprovou o impeachment, tal como queria a maioria da burguesia, a mesma que até ontem sustentava o governo do PT e de Dilma. Um Congresso comandado por um bandido como Cunha e cheio de deputados incriminados nos mais diversos esquemas de corrupção não traria surpresas.
Foi um golpe palaciano, uma manobra antidemocrática, mas o regime político não muda se Michel Temer assumir a presidência. Não teremos um novo regime político, como foi produzido pelo golpe de 64, que liquidou as liberdades democráticas das organizações, dos movimentos e dos partidos de oposição, por isso nunca fiz eco ao discurso do medo. Mas teremos a continuidade de um regime que é uma democracia precária, ou inexistente para o povo pobre. É uma ditadura do capital.
Do lado de fora do Congresso, vimos que a maioria do povo preferia o impeachment à continuidade de Dilma. A rejeição ao governo cresceu ainda mais com a delação premiada de Delcídio do Amaral, líder do próprio governo no Senado. Mas, ao mesmo tempo em que a maioria está contra Dilma, não há entusiasmo nenhum. Com razão o povo não confia no Congresso Nacional, nem em Temer, nem nos líderes desta cínica oposição de direita que, mesmo ajudada pela Rede Globo, que promove seus líderes diariamente, despenca nas pesquisas de opinião. Por isso a maioria prefere eleições, mesmo com esta pauta tendo sido interditada pelos grandes partidos. E mais ainda: a maioria quer outra política econômica que não provoque o desemprego, a inflação, o desmonte dos serviços públicos. Quer uma nova política, oposta a que tem sido feita pelos partidos tradicionais.
Há meses tenho defendido que somente convocando eleições gerais o caminho do impeachment seria evitado. Dilma poderia ter pautado esta proposta enviando uma PEC ao Congresso. Seria um gesto verdadeiro em defesa de uma democracia um pouco mais real. Mas o PT, comandado por Lula, foi contra garantir o direito do povo votar e apostou nas negociações e negociatas do Congresso. Neste terreno Cunha e Temer foram superiores.
Agora uma figura que não tem nenhum apoio popular, nenhuma legitimidade, está prestes a assumir a presidência. Defendi o voto contra o impeachment justamente porque Temer não tem legitimidade para ser presidente. Seu governo vai querer abafar a Lava Jato e atacar direitos populares.
Vou seguir o trabalho que tenho feito desde dezembro: articular a campanha pela realização de eleições gerais. É possível e necessário. Vimos durante a votação que as novas eleições tem eco até mesmo entre muitos deputados, tal é a força desta bandeira. Vou insistir na luta para que o povo decida os rumos do país, cobrando que a Lava Jato continue e apoiando as lutas dos trabalhadores e da juventude em defesa dos interesses do povo.
Com este Congresso podre e com Temer prestes a assumir, agora mais do que nunca: Eleições gerais já!