Pré-sal: recursos não irão para a área social
Nesta semana, o governo encaminhou ao Congresso Nacional os Projetos de Lei referentes à regulamentação da exploração de petróleo no Pré Sal. Um deles, o PL 5940/2008, trata da destinação dos recursos provenientes da exploração do pré-sal, tais como os royalties e outras receitas da venda do petróleo. O governo afirma que essas receitas poderiam chegar à casa dos trilhões de reais.
O PL cria o Fundo Social, que, de acordo com o Art. 1º, teria a finalidade de “constituir fonte regular de recursos para a realização de projetos e programas nas áreas de combate à pobreza e de desenvolvimento da educação, da cultura, da ciência e tecnologia e da sustentabilidade ambiental”. Porém, cabe ressaltar, de imediato, que esse fundo não destinará os recursos para tais áreas sociais, mas, conforme o Art. 4º, os aplicará em ativos que possam proporcionar “a rentabilidade, a segurança e a liquidez de suas aplicações, e assegurar sua sustentabilidade financeira para o cumprimento das finalidades definidas no art. 1º”.
Ou seja: fica completamente afastada a hipótese dos recursos serem destinados diretamente às áreas sociais, dado que essas, por definição, não geram rentabilidade. Na realidade, somente o rendimento do FS é que será destinado às áreas sociais, conforme o Art. 6º, I, segundo o qual “cabe ao Comitê de Gestão Financeira do Fundo Social (CGFFS) definir o montante a ser, anualmente, resgatado do FS, assegurada sua sustentabilidade financeira”.
O governo tenta justificar essa medida pelo fato de que as gerações futuras devem também usufruir dessas riquezas, que teriam um comportamento oscilante, de acordo com a variação dos preços do petróleo. O que não tem sentido, visto que o país tem necessidades urgentes, como a reforma agrária, o fim do déficit habitacional e a melhoria da saúde, da educação, dentre tantas outras.
Mas o pior é que, de acordo com o Art. 7º, o FS poderá adquirir ativos no Brasil ou no exterior, não especificando, porém, que tipo de ativo poderá comprar. Dessa forma, cabe perguntar: qual o tipo de ativo trilionário que garantiria, em tese, “rentabilidade, segurança e liquidez”, atualmente?
A resposta é: títulos da dívida pública mobiliária federal. Portanto, abre-se espaço para que os recursos do pré-sal sejam esterilizados no pagamento da questionável dívida pública, pois, caso o FS compre títulos da dívida, estará viabilizando ao Tesouro pagar os títulos que estão vencendo, por meio do processo de “refinanciamento’.
Cabe alertar também que a dívida interna federal já chegou a R$ 1,8 trilhão em julho de 2009, tendo crescido quase R$ 200 bilhões somente nos primeiros sete meses deste ano. Não se sabe até quando essa espiral irá se sustentar, razão pela qual a destinação dos recursos do pré-sal para a compra de títulos da dívida pública poderá transformar o FS em um imenso “mico”, carregado de títulos que, em algum momento, possam não ser pagos.
Continuam os leilões de venda de poços de petróleo do pré-sal às empresas privadas
Outro Projeto de Lei encaminhado pelo governo foi o PL 5.938/2009, que em seu Art. 8º prevê a continuação dos leilões de mais áreas do pré-sal para as empresas privadas. A ANP – Agência Nacional do Petróleo continuará a ser a entidade promotora dos leilões, conforme o Art. 11, III, o que é bastante negativo, dado o histórico de leilões feitos pela ANP a preços de banana.
O Art. 10 não estabelece qual será o percentual do excedente de petróleo pertencente à União, jogando essa definição para o Conselho Nacional de Política Energética. Cabe então questionar: para que entregar o petróleo do pré-sal para empresas privadas, sem estabelecer, em lei, sequer o percentual do petróleo de propriedade da União?
A resposta a essa questão somente poderia ser o interesse das empresas privadas, além da pressa de ser explorar o petróleo, inclusive para exportação, sem uma estratégia de planejamento do consumo de combustíveis fósseis, que considere o necessário incentivo a novas fontes de energia não-poluentes. Cabe ressaltar que o país quase não investe em fontes renováveis de energia, como, por exemplo, o hidrogênio, que poderia resolver o problema da poluição nas cidades e o aquecimento global.
Permanece, dessa forma, a atual situação, na qual os últimos governos – inclusive o atual – têm leiloado poços de petróleo a preços de banana, como já ocorrido com 30% do pré-sal. É necessária, também, a revogação da Lei 9.478 de 1997, que criou a ANP e regulamentou os contratos de concessão, conferindo às empresas a propriedade do petróleo extraído.
Orçamento para 2010: mais uma vez, o ajuste fiscal
Nesta semana, o governo federal encaminhou ao Congresso Nacional ao proposta de Orçamento para 2010, que aumenta o superávit primário (ou seja, a reserva de recursos para o pagamento da dívida) para 3,3% do PIB no ano que vem. Analisando-se os dados da proposta orçamentária, verificamos que ela destina nada menos que R$ 283 bilhões para juros e amortizações da dívida em 2010, além de R$ 584 bilhões para o refinanciamento da dívida, ou seja, o pagamento de amortizações por meio da emissão de novos títulos. Dessa forma, nada menos que 50% do orçamento do ano que vem (de R$ 1,738 trilhão) está comprometido com juros, amortizações e refinanciamento da dívida.
Importante ressaltar também que, dentro dos R$ 283 bilhões destinados a juros e amortizações estão nada menos que R$ 100 bilhões reservados para a cobertura do prejuízo do Banco Central em 2009, que somente no primeiro semestre já chegou a R$ 93 bilhões. Tal prejuízo monstruoso decorre da entrada massiva de dólares no país para, em grande parte, ganhar com a dívida interna brasileira. O BC compra esses dólares – acumulando grande quantidade de reservas cambiais, que são aplicadas principalmente em títulos dos EUA, que não rendem quase nada – e os paga com títulos da dívida interna, sobre os quais incidem juros altíssimos. Além do mais, esse movimento especulativo faz cair a cotação do dólar, o que desvaloriza as reservas detidas pelo BC, gerando mais prejuízo.
Por outro lado, a proposta orçamentária para 2010 reserva somente R$ 57 bilhões para a saúde (cinco vezes menos que a dívida), R$ 45 bilhões para a educação (seis vezes menos que a dívida) e R$ 5 bilhões para a reforma agrária (57 vezes menos que a dívida). Para os servidores públicos, sempre apontados como vilões das contas públicas, a proposta orçamentária reserva uma quantia R$ 100 bilhões menor que a destinada à dívida, mesmo incluindo-se todos os aposentados e pensionistas, de todas as carreiras e Poderes.
Salário mínimo: reajuste irrisório
A proposta orçamentária prevê que o salário mínimo seria reajustado em 5% acima da inflação no ano que vem. Seguindo-se essa regra (de aumento real conforme o aumento do PIB de dois anos atrás), em 2011 o aumento do mínimo será praticamente nulo, dado que em 2009 o crescimento será próximo a zero. Além do mais, mesmo se o aumento real fosse todo ano de 5%, ainda seriam necessários 30 anos para que o atual salário mínimo chegasse ao exigido pela Constituição, calculado pelo Dieese em cerca de R$ 2 mil.
Banco Central interrompe queda nos juros
O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central decidiu manter a taxa de juros em 8,75% ao ano, o que significa o fim das já irrisórias reduções nessa taxa. Assim, a taxa de juros real brasileira permanece a quarta maior do mundo, contribuindo para o crescimento explosivo da dívida interna. A justificativa utilizada pelo BC é a necessidade de se cumprir as metas de inflação, ou seja, teria-se de manter altas taxas de juros para desestimular a economia, para que os preços possam cair e manter a inflação dentro da meta.
Porém, é importante ressaltar que na ata da reunião anterior, o Copom afirmava que os preços administrados (ou seja, as tarifas públicas) eram responsáveis por quase 30% da taxa de inflação. Portanto, cabe questionar: se o combate à inflação é tão importante a ponto de exigir taxas de juros tão altas (que fazem explodir a dívida pública), por que o governo continua aumentando as tarifas públicas, como luz, telefone, gasolina etc?