Por décadas, pessoas com hanseníase foram confinadas em hospitais-colônia, afastadas compulsoriamente de suas famílias e isoladas da sociedade. Agora, seus descendentes lutam pelo direito à memória, justiça e reparação diante dessa violência estatal. Somando-se a esta causa, a deputada Luciana Genro (PSOL), por solicitação do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan), protocolou Projeto de Lei para garantir a preservação e acesso aos documentos relacionados à separação destes pais e mães de seus filhos e filhas.
No Rio Grande do Sul, dentre os anos 1940 e 1985, mais de duas mil pessoas com hanseníase (a antiga lepra) foram internadas compulsoriamente no Hospital Colônia Itapuã, em Viamão, muitas vezes sem nem mesmo conseguir se despedir de suas famílias. Em 2023, foi aprovada a indenização para os filhos que foram separados de seus pais, como é a situação de diversos dos que foram internados em Itapuã e, em alguns casos, nunca mais se reencontraram. Os ex-internos também têm direito à indenização garantido desde 2007.
“É uma história trágica de pessoas que foram separadas de suas famílias, confinadas e passaram a sua vida inteira – ou grande parte dela – afastadas do restante da sociedade. Este projeto de lei vem no sentido de tentar garantir alguma reparação para estes pacientes e seus descendentes, que também foram duramente afetados por essa situação”, explica Luciana Genro.
A deputada elaborou o projeto após se reunir com Artur Custódio, representante do Ministério da Saúde e ex-coordenador do Morhan nacional, e Magda Chagas, coordenadora do núcleo da Região Metropolitana do Morhan, que tem atuado para auxiliar os filhos a garantirem a indenização à qual têm direito. Segundo relatado por eles, uma das maiores dificuldades é justamente o acesso aos documentos necessários.
O Projeto de Lei 292/2025 vem neste sentido, instituindo uma Política Estadual de Memória, Verdade e Justiça para os Filhos e Filhas Separados pela Hanseníase, com o objetivo de preservar, proteger e promover ações de busca ativa, digitalização e preservação destes documentos e informações. Ainda, busca reconhecer os documentos como potenciais indícios de graves violações de direitos humanos, assim como organizar um banco de dados estadual com estas informações, subsidiar ações, oferecer apoio psicossocial e jurídico às pessoas atingidas e promover campanhas, estudos, exposições e políticas públicas voltadas ao tema.
Os documentos e registros referentes à separação compulsória de filhos e filhas de pessoas internadas ou segregadas por hanseníase deverão ser identificados e recolhidos pelo poder público estadual, organizados, catalogados e preservados. A proposição também determina que o acesso a estes documentos deve ser assegurado às vítimas e seus familiares.
Luciana Genro vem acompanhando a luta do Morhan e também é autora da lei que colocou no Calendário Oficial do Estado o dia 11 de maio como Dia Estadual da Conscientização e Prevenção da Hanseníase. A cura da hanseníase foi descoberta em 1985 e, atualmente, o tratamento é fornecido pelo SUS, sem necessidade de isolamento.