EDITORIAL
O Estado abalado
O Rio Grande nunca passou por um constrangimento desta dimensão. Ao protocolar na 3ª Vara da Justiça Federal de Santa Maria uma ação civil de improbidade administrativa contra a governadora Yeda Crusius e outras oito pessoas com função pública no Estado, a força-tarefa do Ministério Público Federal transformou em denúncia formal as suspeitas que há vários meses recaíam sobre o governo gaúcho. Agora não se trata mais de acusações sem provas, como vinham fazendo integrantes da oposição. No inquérito de mais de mil páginas encaminhado pelo MPF à juíza Simone Barbisan Fortes, estão catalogados documentos e gravações referentes a escutas telefônicas feitas durante as operações Rodin e Solidária, que apuraram irregularidades no Detran e na distribuição de merenda escolar a municípios do Estado. Diante dessas evidências, que infelizmente não foram detalhadas ao conhecimento da opinião pública, os procuradores federais solicitaram liminarmente à juíza que seja levantado o sigilo das ligações que interessam ao processo, pediram também a indisponibilidade dos bens dos réus e o afastamento temporário dos agentes públicos referidos na ação, inclusive da governadora.
Trata-se, portanto, de uma gravíssima e angustiante situação. De um lado, estão governantes e políticos acuados por uma denúncia formal que os incapacita para o exercício normal de suas funções públicas. De outro, estão os cidadãos sentindo-se traídos na confiança que depositaram em seus representantes, sem saber exatamente as irregularidades pelas quais estão sendo denunciados. O mínimo que se espera dos acusados diante da ação proposta ontem é que venham a público pedir a abertura do sigilo das provas e que deem explicações convincentes sobre suas participações nos episódios. Não se compreende, por exemplo, que diante de um fato desta natureza a governadora fique em silêncio, deixando a resposta do governo a cargo de porta-vozes.
Ainda que todos os acusados tenham direito à presunção de inocência e a amplo direito de defesa, já não se pode mais atribuir as denúncias contra eles a articulações movidas por interesses políticos. O Ministério Público Federal, com a legitimidade e a independência que a Constituição lhe assegura, depois de examinar as provas, concluiu pela ação de improbidade administrativa que pede a perda dos bens adquiridos indevidamente pelos denunciados, o ressarcimento da lesão ao patrimônio público, a perda dos cargos, a suspensão de seus direitos políticos e ainda uma multa civil. Ao limitar a natureza da ação à área cível, os procuradores evitam estrategicamente que algum dos acusados se refugie no instituto do foro privilegiado, o que deve transmitir maior transparência para o processo.
É saudável que seja assim, pois o Rio Grande tem pressa de resolver este imbróglio que dificulta a governabilidade e emperra a administração. Neste sentido, é desejável também que o Judiciário, em todas as instâncias requeridas, aprecie a ação com o máximo de celeridade, para evitar que o Estado fique purgando esta ferida pelo restante dos mandatos dos acusados investidos de cargos públicos. Além da governadora, a demanda atinge diretamente quatro ex-presidentes da Assembleia Legislativa – o deputado federal José Otávio Germano, os deputados estaduais Luiz Fernando Záchia e Frederico Antunes, e o presidente do Tribunal de Contas do Estado, João Luiz Vargas. Também estão citados o vice-presidente do Banrisul Rubens Bordini, o ex-secretário Delson Martini, o ex-marido da governadora, Carlos Crusius, e a assessora especial Walna Vilarins Meneses.
O que se espera desses agentes públicos é que exijam acesso ao inquérito para que a população também possa saber quais são as acusações e quais são os seus argumentos de defesa. Só a transparência total poderá atenuar o choque pelo qual passa o Estado neste momento, ao constatar um provável envolvimento direto de governantes e representantes políticos em esquemas delituosos que envergonham a história do Estado. O Rio Grande precisa da verdade. Agora com muito mais urgência do que antes.
O GOVERNO COMO RÉU
Uma sombra de 1.238 páginas
Rosane de Oliveira
A maldição de agosto, o mês do mau agouro na política brasileira, abateu-se sobre o Rio Grande do Sul na tarde nublada do quinto dia: uma ação civil de improbidade administrativa protocolada ontem na 3ª Vara da Justiça Federal de Santa Maria pelo Ministério Público Federal (MPF) mergulhou o Estado na mais profunda crise política da sua história recente. A incerteza ronda o Palácio Piratini e cria uma interrogação sobre o que serão os próximos 17 meses do governo de Yeda Crusius.
Pela primeira vez, um governador no exercício do cargo vira réu em uma ação movida pelo MPF e corre o risco de perder o cargo por decisão judicial. Yeda Rorato Crusius, a primeira mulher eleita governadora no Rio Grande do Sul, é uma das nove pessoas citadas na ação de improbidade administrativa que tentará reaver para os cofres públicos o dinheiro desviado na fraude do Departamento Estadual de Trânsito (Detran).
Com Yeda, transformaram-se em réus o ex-marido dela, Carlos Crusius, a assessora Walna Vilarins Meneses, o ex-secretário Delson Martini, o vice-presidente do Banrisul e ex-tesoureiro da campanha, Rubens Bordini, dois deputados estaduais – Frederico Antunes (PP) e Luiz Fernando Záchia (PMDB) – um deputado federal, José Otávio Germano (PP), e o presidente do Tribunal de Contas do Estado, João Luiz Vargas.
– Não haverá moleza para esses réus – avisou na entrevista o procurador Adriano Raldi, um dos seis membros da força-tarefa que nos últimos meses cruzou informações para montar o quebra-cabeça da fraude no Detran.
Juíza de Santa Maria decidirá futuro de Yeda
O conteúdo do calhamaço de 1.238 páginas, amarrado com uma fita preta e colocado sobre a mesa durante a entrevista, só é conhecido dos procuradores e hoje deve chegar às mãos da juíza Simone Barbisan Fortes, de Santa Maria. Para montar a ação, os procuradores tomaram depoimentos e analisaram 20 mil escutas telefônicas obtidas não só na Operação Rodin como em outras três investigações, entre elas a Operação Solidária.
Trechos de escutas desprezados na primeira fase da Operação Rodin foram reanalisados e comparados com outras gravações para ganhar sentido. Os procuradores acreditam ter chegado à gênese da fraude, identificando novos beneficiários dos recursos desviados.
Mesmo esperando desde junho por uma manifestação do MPF, os secretários e a base aliada de Yeda na Assembleia foram tomados pela perplexidade. Ninguém esperava que os procuradores fossem tão longe. A primeira reação pública foi subestimar a ação, argumentando que ninguém sabe exatamente quais são as acusações, mas nos bastidores o clima é de apreensão.
Yeda não estava no Palácio Piratini no momento em que a bomba eclodiu. Na véspera, ao saber que o MPF divulgaria as conclusões da investigação complementar da fraude no Detran, foi se refugiar no Palácio das Hortênsias, em Canela. Contrariou o conselho de assessores, que preferiam vê-la na trincheira do Piratini, se defendendo de eventuais acusações.
Ficou no Piratini, para falar pelo governo, o chefe da Casa Civil, José Alberto Wenzel. Com o rosto vermelho e a o tom de voz acima do habitual, Wenzel insinuou que a ação de improbidade é um ato político dos procuradores. Reclamou da falta de detalhes sobre as acusações, para que cada um possa se defender, e garantiu que Yeda despachou normalmente no Palácio das Hortênsias e recebeu “com serenidade” a manifestação dos procuradores. O presidente da CEEE, Sérgio Camps, que falou com Yeda por telefone contou que ela estava “razoavelmente serena, mas indignada”. A governadora teria se sentido desrespeitada pela forma como os procuradores apresentaram a denúncia.
Se a Justiça aceitar o pedido dos procuradores, Yeda será afastada temporariamente do cargo e ficará sujeita à perda definitiva do mandato e dos direitos políticos. Não é só: para os réus, também foi pedida a decretação da indisponibilidade dos bens, “a perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio”, o ressarcimento integral do dano ao Erário, o pagamento de multa e a proibição de contratar com o poder público. Seja qual for a decisão da juíza de Santa Maria, cabe recurso às instâncias superiores da Justiça.
Os seis procuradores, que recitaram uma espécie de jogral, não apresentaram provas nem disseram o que existe de comprometedor contra cada um dos nove réus.
Alegando impedimento legal, por conta do sigilo que envolve provas obtidas por meio de escutas telefônicas, recusaram-se a detalhar as acusações. Também se negaram a falar em delação premiada, acordo pelo qual Lair Ferst teria fornecido informações que ajudaram a montar o quebra-cabeça da investigação. Apenas disseram que na fraude do Detran os réus seriam enquadrados em uma ou mais de três categorias: operadores, intermediários ou beneficiários do dinheiro desviado. O procurador Fredi Wagner citou enriquecimento ilícito, dano ao Erário e desrespeito aos princípios da administração pública como atos de improbidade administrativa.
– Queremos que a impressão seja de estímulo e não de desânimo, porque estamos buscando a reparação aos cofres públicos – disse o procurador Ivan Marx na sua vez de falar.
A oposição não perdeu tempo. Mal terminou a entrevista dos procuradores, o PSOL protocolou, às 16h55min, um requerimento para que seja apreciado o pedido de impeachment solicitado pelo partido no ano passado. O requerimento foi arquivado por decisão do então presidente, Alceu Moreira (PMDB), mas o PSOL entrou com recurso e aguarda manifestação da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Independentemente da posição da CCJ, o pedido deve ser votado em plenário.
De olho nos dividendos políticos, o PT preferiu aproveitar o momento para buscar as assinaturas necessárias à instalação de uma CPI. Em poucos minutos, os deputados do PDT que resistiam se renderam: Gerson Burmann, Giovani Cherini e Kalil Sehbe assinaram o requerimento que assegura a CPI. A oposição tinha, até então, 17 das 19 assinaturas necessárias. Tem 20, agora.
À primeira vista, a CPI é desnecessária. Se o rito prevê que a comissão encaminhe suas conclusões ao Ministério Público, não teria sentido a Assembleia partir da denúncia já feita pelo MPF. O cálculo dos deputados, porém, é político. Líderes do PT avaliam que uma CPI permitirá ampliar o leque de investigações para outras pessoas e fatos, multiplicando o desgaste entre os aliados do governo.
Diante da possibilidade de afastamento da governadora – pela Justiça ou por um processo de impeachment –, já começaram as especulações sobre o que será um eventual governo de Paulo Feijó. O vice optou pelo silêncio, mas seus companheiros de partido não escondem o entusiasmo com a perspectiva de assumir o poder. Integrantes do governo acreditam que Feijó não terá oportunidade de usar o terno da posse. Confiam na lentidão da Justiça e nos recursos que a governadora pode usar para se manter no cargo até o julgamento em última instância.
OPOSIÇÃO COMEMORA
CPI e pedido de cassação avançam
Com o anúncio da ação no MPF, petistas viabilizaram comissão e PSOL reforçaram possibilidade de impeachment de Yeda
Leandro Fontoura
*Colaborou Luís Bissigo
Com o anúncio da ação de improbidade administrativa do Ministério Público Federal, a Assembleia Legislativa se tornou território da oposição ontem. Se poucos governistas eram vistos pelos corredores do parlamento, adversários da governadora Yeda Crusius atuaram em duas frentes: reafirmaram o pedido de impeachment contra ela e deslancharam a CPI da Corrupção. O contra-ataque do Palácio Piratini partiu do chefe da Casa Civil, José Alberto Wenzel.
Em compasso de espera desde maio, a nova CPI só está prestes a sair do papel porque três deputados do PDT resolveram assinar o requerimento da comissão, que agora tem 20 signatários, um a mais que o mínimo necessário. Gerson Burmann, Giovani Cherini e Kalil Sehbe tomaram a decisão em conjunto, na casa de Cherini, logo após a manifestação dos procuradores da República. No início da noite, os três foram para a Assembleia, onde encontraram o resto da bancada pedetista e os deputados do PT. Cherini afirmou que assinava a CPI com “tristeza” e condenou as comemorações da tarde.
O deputado se referia à manifestação de estudantes e sindicalistas e em frente ao Piratini. Em festa, o grupo acompanhou os líderes do PSOL em visita à Assembleia. A deputada federal Luciana Genro e o vereador Pedro Ruas estiveram no Legislativo para protocolar um requerimento para que a Casa vote o pedido de impeachment feito em junho de 2008 e arquivado pelo então presidente, Alceu Moreira (PMDB). Em análise na Comissão de Constituição e Justiça, o desarquivamento será examinado também pelo plenário. Caso aceita, a tramitação do afastamento ocorrerá em quatro fases, sendo a última o julgamento da governadora.
– Há uma quadrilha instalada no Piratini. É tarde para CPI, pode ser uma medida protelatória. É o momento de votar o impeachment – afirma Luciana.
Futura presidente da CPI, a deputada estadual Stela Farias (PT) defendeu a tramitação paralela da comissão e do pedido de impeachment. Ela entrega hoje ao presidente da Assembleia, Ivar Pavan (PT), o pedido de instalação da comissão. Depois de o requerimento passar por Pavan e pela Procuradoria da Casa, será aberto o prazo para as bancadas indicarem representantes. Segundo Stela, as investigações serão focadas nas operações Rodin e Solidária, as denúncias do PSOL e de Magda Koenigkan, viúva do ex-assessor Marcelo Cavalcante, e a polêmica dívida de R$ 16 milhões cobrada pela Atento junto ao Detran e contestada por dois ex-presidentes da autarquia.
Em outra linha de atuação, a oposição sugeriu a Pavan que encaminhe à Justiça Federal um pedido de quebra do sigilo da ação dos procuradores. Pavan classificou a ação do MPF de um fato inédito, profissional e ousado. Além de defender a quebra de sigilo, o presidente da Casa apoiou a CPI por conta dos “novos fatos em abundância”. Já o vice-governador Paulo Feijó se disse “consternado, mas não surpreso”:
– Não posso opinar sobre a ação do MPF em si, mas não me surpreendo pelos fatos que vieram à tona. Confio nas instituições.
Os caminhos da ação na Justiça
Adriana Irion e Alexandre De Santi
Desde novembro de 2007, quando a Polícia Federal deflagrou a Operação Rodin prendendo 13 pessoas, não foram poucos os boatos sobre o envolvimento de políticos e de pessoas com foro privilegiado na fraude milionária do Detran.
Conforme procuradores da República que assinam a ação, o trabalho deu “concretude a informações de destinação de dinheiro a partidos e de pressões de governo.”
– A informação vaga (que havia em meados de 2007) foi transformada em nomes concretos que participavam daquele contexto (desvendado na Rodin) – disse o procurador da República Enrico de Freitas.
A ação foi embasada em reexame de provas coletadas nas investigações da Rodin e da Operação Solidária, que apura fraude em licitações. Abaixo, entenda as consequências da ação ajuizada ontem.
Juíza segue processo há dois anos
A nova etapa na Operação Rodin aberta pela ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) encontrará uma velha conhecida: a juíza federal Simone Barbisan Fortes. Foi ela que, em maio do ano passado, transformou em réus 40 suspeitos de envolvimento na fraude milionária do Detran. Hoje, são 33 os réus no caso.
Agora, Simone irá analisar a peça em que os procuradores da República pedem o bloqueio de bens e o afastamento do cargo da governadora Yeda Crusius e de outros oito agentes públicos.
Natural de Três de Maio e integrante da 3ª Vara Federal de Santa Maria. Simone foi para Santa Maria ainda criança, formando-se em Direito pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) em 1998. Dois anos depois de graduada, tornou-se juíza federal. Simone atuou em Porto Alegre e Passo Fundo, mas decidiu retornar a Santa Maria. Além de magistrada e docente, Simone é maratonista.
ROSANE DE OLIVEIRA
Lacunas a preencher
Os gaúchos só saberão a extensão do estrago provocado pela bomba que o Ministério Público Federal detonou ontem quando forem conhecidas as acusações específicas contra cada um dos réus e as provas que as sustentam. O sigilo invocado pelos procuradores fez o trabalho parecer incompleto. Não basta saber que foram encontradas provas contra os nove réus: o cidadão precisa saber o que há contra cada um.
A expectativa é de que a juíza Simone Barbisan Fortes levante o sigilo nos próximos dias. O próprio MPF pediu a ela que torne pública a íntegra da ação civil, o que significa dar a conhecer, por exemplo, o conteúdo das escutas que ajudaram a formar convicção sobre a culpa dos réus.
Ontem, o chefe da Procuradoria da República no Rio Grande do Sul, Antônio Carlos Welter – que não participou da entrevista –, justificou a cautela. Disse que os procuradores optaram por não divulgar as provas para evitar que a instituição fosse acusada de sensacionalismo, como já ocorreu com a Polícia Federal.
– Queremos demonstrar que o trabalho é sério, técnico e que segue a lei – disse Welter.
Aliás
Será difícil para o Piratini reverter a percepção de que o governo de Yeda acabou em 5 de agosto, com a ação de improbidade do MPF, e que os próximos meses serão marcados pela incerteza.
Profecia do vice
Em conversas privadas, o vice Paulo Afonso Feijó tem comentado:
– Se 10% do que há para vir à tona vier, a governadora não irá se sustentar 24 horas.
Feijó evita a todo o custo passar a imagem de que aguardaria a queda da governadora para assumir o cargo. Ontem, disse estar “consternado”, mas “não surpreso”.
Desenvoltura
Nem parecia que, até março, o ex-ouvidor-geral da Segurança Adão Paiani era filiado ao PSDB e membro do governo Yeda Crusius. Autor de denúncias contra a administração tucana, o advogado deu um forte abraço no vereador Pedro Ruas quando o PSOL foi solicitar agilidade no pedido de impeachment. Paiani também passou horas ao lado de Paulo Azeredo (PDT), compartilhando um mate. O ex-ouvidor defendeu a renúncia de Yeda.
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Diante da bomba que o MPF apresentou, a criação de uma CPI tornou-se secundária: mesmo com todas as assinaturas necessárias para a sua instalação, a comissão dividirá as atenções com o pedido de impeachment.
AMIGO NO CONSELHO
Duque rejeita ações contra Sarney
Em poucos minutos, presidente do Conselho de Ética arquivou quatro dos 11 pedidos de investigação relativos ao peemedebista
Depois de um longo período de crise, ontem foi um bom dia para o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Logo depois de descer da tribuna e, titubeante, apresentar sua versão para as denúncias que recaem sobre ele, o peemedebista começou a colher suas boas notícias: uma a uma, as quatro primeiras denúncias contra ele foram arquivadas pelas mãos do amigo, aliado e presidente do Conselho de Ética, Paulo Duque (PMDB-RJ).
Duque enterrou em poucos minutos três pedidos de Arthur Virgílio (PSDB-AM) e dois da bancada do PSOL – uma delas questionando a postura do principal aliado de Sarney, o alagoano Renan Calheiros (PMDB).
Em suas decisões, Duque alegou que as matérias não apresentavam evidências que justificassem a abertura de investigação contra Sarney e Calheiros. Na primeira decisão, o presidente do conselho rejeitou denúncia de Virgílio que pedia investigação de Sarney por supostamente ter beneficiado a empresa de um neto que atuava no mercado de crédito consignado no Senado. Duque argumentou que a denúncia se referia a episódio ocorrido em outra legislatura.
A denúncia seguinte, que tratava da suposta responsabilidade de Sarney sobre irregularidades em um convênio de R$ 1,3 milhão da Petrobras com a Fundação José Sarney, foi derrubada por Duque com a justificativa de que “se pautava em notícias publicadas nos jornais e, por isso, não atendia aos requisitos regimentais”. A terceira denúncia rejeitada também diz respeito à Fundação José Sarney: o peemedebista teria usado o cargo para facilitar a celebração de contratos com a Petrobras e o argumento de Duque foi de que “os fatos são anteriores ao mandato”.
As outras duas representações, as do PSOL, contra Sarney e Calheiros, pediam a investigação da responsabilidade dos dois senadores sobre os atos secretos do Senado e foram rejeitadas igualmente por se basearem em reportagens publicadas pela imprensa.
Ao discursar na tribuna, Sarney centrou sua fala nas críticas à imprensa, resposta às denúncias e exaltação da própria biografia:
– Até hoje eu não usei esta tribuna para rebater as inverdades contra mim disseminadas aqui mesmo e na mídia nacional. Avaliei que as críticas que me fizeram eram só rescaldos da eleição, mas eram mais profundas. Faziam parte de um projeto político e de uma campanha para me desestabilizar.
Ele negou que pretenda renunciar:
– Não tenho cometido nenhum ato que desabone a minha vida. Não tenho senão que resistir, foi a única alternativa que me deram. Todos aqui somos iguais, ninguém é melhor que o outro. Não podem esperar de mim que cumpram a sua vontade política de renunciar.
Oposição tentou evitar abafa
Os adversários da permanência do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), no cargo, tentaram evitar que o presidente do Conselho de Ética, Paulo Duque (PMDB-RJ), arquivasse os processos contra o comandante da Casa.
O senador José Nery (PSOL-PA) apresentou requerimento solicitando que Duque se declarasse impedido de deliberar sobre as três representações apresentadas pelo partido, sob a alegação de que Duque não teria independência para proceder contra Sarney.
Já o discurso de Sarney da tribuna foi visto por adversários como “inócuo”. O senador Álvaro Dias (PSDB-PR) afirmou que o discurso de Sarney “aplaca os ânimos, mas não resolve a crise”. Na avaliação do senador Demóstenes Torres (DEM-GO), o discurso teve por objetivo levar o Conselho de Ética a arquivar as 11 ações que recebeu contra Sarney.