Uma comitiva de lideranças da Vila Dique, na Zona Norte de Porto Alegre, compareceu à reunião da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa nesta quarta-feira (27/03) para relatar a situação de abandono em que vive a comunidade. De 2008 a 2012 a prefeitura realizou um processo de reassentamento de 1.690 famílias da Vila Dique ao empreendimento Porto Novo, mas 240 famílias ainda permanecem na região e não contam mais com acesso a energia elétrica, escola, posto de saúde e galpão de reciclagem.
Um dos principais problemas enfrentados pelos moradores é a ausência de fornecimento regular de energia elétrica, já que a CEEE se recusa a fazer as ligações nas casas. Com isso, a população acaba tendo que recorrer aos chamados “gatos”, sofrendo perseguição da polícia. “É uma vergonha que a polícia venha prender trabalhadores por causa disso. Os moradores não estão se negando a ter medidor de luz, é a CEEE que não quer instalar. Os postes estão caindo em cima do povo”, denunciou Vera Lúcia Fernandes, da Associação de Moradores da Vila Dique.
Outro problema grave que atinge a comunidade é a dificuldade de acesso à escola. A Vila Dique é cercada por um muro próximo ao Aeroporto Salgado Filho que impede que as crianças percorram o trajeto mais próximo até o colégio, que leva cerca de 15 minutos. Com o bloqueio do muro, é preciso pegar um ônibus e o percurso até a escola passa a levar uma hora. Como as famílias não possuem recursos para pagar a passagem, fizeram um buraco no muro para que os alunos pudessem passar. Mas a travessia foi fechada e, em agosto do ano passado, quando mães tentaram reabrir o buraco, chegaram a ser algemadas pela polícia.
“Os adolescentes não estão indo à escola. Estão expostos ao mundo do tráfico. Eu moro há mais de 30 anos na comunidade e estou muito preocupada com isso. Estou aqui pedindo ajuda”, disse Vera Lúcia.
A defensora pública Isabel Wexel, que atua na assistência jurídica aos moradores, ressaltou que a área em que a comunidade vive há décadas é privada e que nunca houve um pedido de reintegração de posse. “A própria prefeitura já disse no processo que não tem interesse na área. Vamos lutar até o fim para que os moradores permaneçam lá. Pedimos que a Comissão nos ajude a garantir dignidade e sobrevivência a essas pessoas”, solicitou.
A arquiteta Claudia Favaro, que auxilia os moradores da Vila Dique, denunciou o processo de remoção forçada pelo qual a comunidade passou, afirmando que os apartamentos do empreendimento Porto Novo não são adequados às necessidades dos moradores. Grande parte vive de atividades relacionadas à reciclagem de resíduos, dependendo de carrinhos e animais para realizar o trabalho, por isso necessitam de casas com espaço para estes materiais.
“Moradia não é só garantir um teto e quadro paredes. Esse trabalho da comunidade com o lixo precisa ser valorizado”, defendeu Claudia.
A deputada estadual Luciana Genro (PSOL) convidou os moradores da Vila Dique a se somarem à Frente Parlamentar em Defesa da Moradia Digna, que será lançada no dia 17 de abril na Assembleia. Luciana será a presidente do grupo e irá propor uma série de audiências públicas para chamar os órgãos de Estado envolvidos no tema da moradia a dar explicações sobre a situação dos moradores e apresentar soluções. “A Vila Dique é um exemplo de abandono completo do poder público, com uma população que há anos resiste bravamente para ter seu direito à moradia. Coloco a nossa frente parlamentar à disposição de vocês”, disse a deputada.
Como encaminhamentos, a Comissão de Direitos Humanos irá pessoalmente entregar um ofício exigindo ações do prefeito de Porto Alegre, Nelson Marchezan Júnior (PSDB), e também buscará uma reunião com a direção da CEEE para solicitar a ligação de energia elétrica aos moradores. O colegiado irá, ainda, agendar uma visita coletiva de todos os deputados titulares à Vila Dique.