Carta-compromisso da candidata à Presidência pelo PSOL, Luciana Genro, com o Movimento Negro

É inegável a dívida histórica deste país com a população negra que foi açoitada por mais de três séculos e no pós-abolição foi excluída do projeto de nação, produzindo um verdadeiro abismo econômico, social e cultural entre negros e não negros.

As marcas deste abismo se traduzem em nosso cotidiano por meio da prática do racismo que estrutura as relações de poder no Brasil. Os Amarildos, Cláudias, Douglas, Terezinhas são exemplos desse cotidiano violento que marca a vida da população negra, onde o Estado Democrático de Direito ainda é direito a ser conquistado.

O modelo de expansão do capitalismo por meio dos grandes centros tem produzido um  verdadeiro processo de limpeza étnica e social que se consolida cada vez mais como uma bomba-relógio, pois é também incapaz de responder de fato aos anseios de parcela significativa da população. Com a maioria população vivendo cada vez mais distante dos centros urbanos, com baixa infraestrutura, com transporte público precário, com poucos equipamentos públicos, combinado com a queda na capacidade de consumo, há diretamente como consequência o aguçamento da violência.

Enquanto o modelo de desenvolvimento das cidades e do país estiver a serviço dos interesses das grandes corporações em detrimento de um desenvolvimento sustentável e cidadão, que regule os territórios, que taxe as grandes fortunas e garanta, de fato, uma distribuição de renda eficiente, a população permanecerá vulnerável e sujeita a viver de forma precária.

O atual modelo de segurança pública intensifica o processo de criminalização da pobreza, produzindo um discurso do medo, além de tentar esconder as contradições e os problemas sociais latentes. O combate à violência está longe de ser um problema de polícia. É sim um problema estruturante da sociedade brasileira. Por isso, precisamos de mudanças e ações imediatas.

Acreditamos que a superação do racismo, bem como das maiores mazelas que atinge o povo brasileiro, depende também do rompimento com os interesses do grande capital privado e de sua lógica de operação do Estado. Não será por pequenas reformas ou políticas compensatórias que alcançaremos mudanças estruturais capazes de eliminar as desigualdades. Mas é preciso dar respostas possíveis e concretas aos problemas do agora. E para isso propomos:

1 – A população Negra, maioria do povo brasileiro, é também quantidade muito significativa dos responsáveis pela produção e pelo consumo em nossa sociedade. A riqueza e a sustentação da nação brasileira passam por suas mãos. Não é justo que essa população continue vivendo a margem das oportunidades e exposta a violências tão profundas. É papel do Estado promover um permanente incentivo à cultura da diversidade, do respeito e de valorização aos direitos humanos. É necessário agir.

2 – O Estado é, na relação com a população, o primeiro promotor do racismo. Seja através dos serviços de saúde pública, precários como são; através dos serviços educacionais, degradados e segregatórios como estão e são; ou através da segurança pública e sua força repressiva, seletiva, violenta e letal, como sabemos. O enfrentamento ao racismo estrutural e institucional é o primeiro passo para a construção de um imaginário e uma cultura de respeito às diferenças, valorização da diversidade cultural, religiosa, política e aos valores dos direitos humanos.

Educação e mobilização para o combate ao racismo:

 

  • Ação emergencial de práticas de Educação Popular para o combate ao racismo e o fomento da diversidade e dos direitos humanos em todo país através do fortalecimento de organizações negras que desenvolvem projetos no campo educacional. Também é fundamental fomentar a ampliação e massificação de iniciativas governamentais tais como os programas Justiça ComunitáriaCasa de Direitos (Plano de Enfrentamento  à Violência nas Periferias Urbanas), Pontos de Cultura, Casas de Cultura, entre outros.
  • Criação do Fundo para Reparação Histórica e Humanitária para os Descendentes de Escravizados e Indígenas (Previsto pela Declaração de Durban – África – 2001)
  • Campanha Nacional de Mobilização pela Prática da Lei 10639 nas escolas públicas do país; Criação de instrumentos de acompanhamento e cobrança da execução da Lei ante as administrações Públicas; Ampliação para 10% do PIB para Educação – Ação em conjunto com movimento negro;
  • Criação da Comissão Nacional da Verdade, Memória e Justiça para os Crimes da Escravidão e Crimes de hoje por parte do Estado – Que reúna pesquisadores, historiadores, antropólogos, economistas, religiosos, artistas e movimento negro para recontar a história e reconstruir a memória nacional a partir da escravidão negro-indígena;
  • Transformação do Plano Juventude Viva em PROGRAMA, para que avance para além de um apanhado de políticas pré-existentes, com destinação de recursos equivalentes à gravidade do problema que se dispõe a enfrentar e garantia de autonomia de ação;
  • Titulação de todos os territórios quilombolas e indígenas e emergencial retomada da reforma agrária – Casos emblemáticos: Quilombo do Rio dos Macacos Salvador/BA e Povo Guarani Kaiowas – MS;
  • Promoção de espaços de diálogo, audiências e consultas públicas permanentes, abertas e livres, por parte do governo no que diz respeito à temática do combate ao racismo;
  • Mudança na Lei de Cotas Federal: que o percentual de negras/os por estado incida sobre 100% das vagas;
  • Politica de Permanência estudantil para alunos cotistas e cotas na pós-graduação;
  • Pronunciamento em rede nacional – sobre o problema do racismo enquanto estruturante das desigualdades e herança cultural a ser combatida; Divulgação da agenda de ações antirracistas;
  • Força tarefa de todos os ministérios no sentido de, de maneira articulada, assumir o genocídio da juventude negra como uma realidade e a co-responsabilidade do Estado. A partir daí, construir espaços de elaboração de ações interministeriais de enfrentamento ao genocídio; Estipular data para apresentação de metas e resultados das ações. Isso deve ser tratado com prioridade de governo.

 

Sobre a violência racista:

 

  • Regulamentação do artigo 5º. da Constituição brasileira que define o racismo como crime inafiançável e imprescritível; Tornar Racismo como Crime de Lesa Humanidade;
  • Desmilitarização das polícias e imediato debate público sobre um novo modelo de segurança pública – comunitária, humanizada e antirracista;
  • Não aprovação de leis “anti-terror” que criminalizem movimentos sociais e determinados perfis de grupos;
  • Pela revogação imediata da Portaria Normativa 3461/13, publicada pelo Ministério da Defesa, que disciplina a atuação das Forças Armadas em ações de segurança pública e que institui o Manual de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), que atribui poder de polícia às três Forças Armadas, mediante ordem da presidente da República;
  • Aprovação do PL 4471 que prevê o fim dos “autos de resistência” em todo país;
  • Fim da revista vexatória;
  • Federalização dos crimes cometidos por policiais civis e militares – Caso emblemáticos dos crimes de maio de 2006 em São Paulo;
  • Formulação de um projeto que prevê a responsabilização penal de racismo e assassinatos promovidos por policiais;
  • Política de apoio psicossocial para familiares de vítimas do Estado;
  • Indenização para familiares de vítimas do Estado;
  • Imediato mutirão do Judiciário para revisão de penas dos presos;
  • Chega de prisões! Pelo fim da política do encarceramento em massa;
  • Pelo direito democrático às manifestações livres e autônomas, sem necessidade de tutela, acordo ou aviso prévio a instituições repressivas do Estado. Pelo direito à LIVRE manifestação, sempre garantido o pressuposto da dignidade humana;

Política Internacional

  • É obrigação do Estado Brasileiro acolher e integrar o povo Haitiano, bem como todo o povo das Américas e da África, que vierem ao país na condição de refugiados;
  • Pela retirada das Tropas Brasileiras do Haiti, por uma saída política, soberana da crise do povo Haitiano e a garantia de ajuda humanitária.