Programa » Habitação e Reforma Urbana

O modelo brasileiro de desenvolvimento favoreceu a especulação imobiliária nas grandes cidades, expulsando com isso a população mais pobre para zonas distantes e aumentando ao mesmo tempo os custos de infraestrutura e de transportes. O combate à segregação urbana em nossas metrópoles passa pelo fim da aceitação de que imóveis são ativos de investimento. Imóveis são bens sociais e devem cumprir a função social da propriedade. O programa habitacional que defendemos é um eixo norteador de um grande Plano Nacional de Desenvolvimento Urbano que esteja articulado à necessidade imperativa do direito à cidade para quem nela habita, ou seja, que as cidades sejam planejadas e construídas de acordo com os interesses e as necessidades da maioria de sua população.

Prioridades:

a) Criar um sistema nacional de desenvolvimento urbano estruturado que garanta a plena hierarquia de competências dos entes federativos e a execução de instrumentos de democratização do direito à cidade, desde os pequenos núcleos às grandes metrópoles;
b) Zerar o déficit habitacional nas cidades médias e grandes;
c) Retomar a capacidade do Estado em planejar, intervir e gerenciar a produção do espaço urbano com atuação direta do governo federal;
d) Assegurar a participação popular no planejamento e execução do desenvolvimento urbano, a partir da obrigatoriedade de mecanismos de controle social, especialmente sobre o orçamento;
e) Urbanizar e regularizar favelas em todo o país.

Propostas de eixos de ação refere à habitação e reforma urbana:

1. Estabelecer um Plano Nacional de Desenvolvimento Urbano que rediscuta a administração do território urbano e torne realidade a utilização dos instrumentos presentes no Estatuto das Cidades

A realização de uma efetiva e necessária Reforma Urbana passa em primeiro lugar por garantir a efetividade de medidas de democratização do acesso à terra urbanizada, combatendo a especulação imobiliária e exigindo o cumprimento da função social da propriedade. Instrumentos como o IPTU progressivo no tempo, o parcelamento compulsório de imóveis que não cumprem sua função social e as Zonas Especiais de Interesse Social que garantem moradia digna no planejamento urbano são formas de ampliar o direito à cidade e combater a segregação urbana. Embora esses dispositivos estejam previstos desde 2001 no Estatuto das Cidades, raramente são implantados. Custa caro à sociedade que financia o Estado manter a infraestrutura urbana em áreas que só atendem à especulação. A implantação destes e de muitos dos instrumentos assegurados no Estatuto das Cidades não se efetiva por conta da incapacidade da União de intervir nas questões urbanas fundamentais.

Elaboraremos, em conjunto com os movimentos sociais e a sociedade civil, um Plano Nacional de Desenvolvimento Urbano que enfrente o desafio de pensar o planejamento urbano em longo prazo a partir das diferentes demandas das diversas cidades do país, desde as pequenas às grandes metrópoles. Para tanto é fundamental reestruturar o pacto federativo assegurando clara hierarquização das competências dos entes e controle social para garantir a plena execução dos dispositivos de democratização das cidades. Tudo isso requer que o governo federal seja o principal responsável por assegurar a implantação deste plano nos estados e municípios.

2. Planejamento e Orçamentos Participativos obrigatórios em todos os municípios do país

Um problema central do panorama urbano brasileiro é a completa ausência de mecanismos efetivos de participação popular e democracia direta no planejamento das cidades. Nesse cenário, os negócios de todo o tipo – e especialmente os financeiros e imobiliários nas grandes metrópoles – são os principais planejadores das cidades. Ou seja, o desenvolvimento urbano atende prioritariamente aos interesses do grande capital em prejuízo das demandas mais sentidas pelo povo.

Reverter tal quadro é um imperativo para ter cidades justas e viáveis nos aspectos social, econômico e ambiental. Em nosso governo o planejamento e o orçamento urbanos de todas as cidades do país, a partir de regulamentação própria que preveja a diversidade de realidades, deverão contar obrigatoriamente com plena e ativa participação popular, sendo condição para que os estados e municípios recebam transferências de recursos e investimentos do governo federal.

3. Nova Lei do Inquilinato

Nos últimos anos as ocupações de terras e prédios urbanos se multiplicaram em função da alta astronômica dos preços dos aluguéis que chegaram a ser reajustados muitas vezes acima das taxas de inflação. Esses reajustes abusivos criam sérios problemas na infraestrutura urbana, alargando o déficit habitacional com a expansão de habitações precárias e em áreas de risco e aumentando a pressão por equipamentos e serviços públicos nas áreas periféricas. Combater a especulação imobiliária é o principal objetivo da elaboração de uma nova lei do inquilinato que estabeleça limites aos reajustes dos aluguéis, garantindo que esses não estejam acima da inflação.

4. Implantação de política federal de desapropriação de terrenos ociosos e destinação de terrenos da União (SPU) para habitação popular

A lei de desapropriações no país premia o especulador. Uma área ociosa, que não cumpre função social, pode ser desapropriada pelo Estado, mas os governos são obrigados a pagar em valor de mercado e à vista e, por conta disso, há proprietários que festejam a desapropriação e fazem até conluios para que elas ocorram. Quem especula com a terra – urbana ou rural – precisa ser punido e não premiado pela lei. Como proposta mínima para uma política federal de desapropriação, se a terra está sendo usada para especulação, deve ser objeto de desapropriação compulsória, pelo valor venal e com pagamento em títulos da dívida pública. Ao mesmo tempo é fundamental garantir que haja um banco público de terras para não deixar que os terrenos urbanos sejam monopólio do mercado imobiliário. Os terrenos da União não utilizados devem ser alvo de políticas de desapropriação que tenham como prioridade a resolução do déficit habitacional.

5. Política de combate a despejos forçados, criando Secretaria específica no Ministério das Cidades

Como se viu durante todo o período de preparação do país para a Copa do Mundo, os despejos forçados são a regra na execução do planejamento urbano brasileiro, controlado pela avidez do mercado imobiliário em consórcio com os políticos que se elegem em função do financiamento de empreiteiras e construtoras. Combater os despejos forçados é uma necessidade que demanda a criação de uma Secretaria específica no Ministério das Cidades. Ela deve ser a mediadora dessas situações.

6. Ampla reformulação do Programa Minha Casa Minha Vida (MCMV)

Gestado como política industrial para ampliar os negócios imobiliários vinculados às grandes empresas da construção civil e ao capital financeiro, o MCMV precisa de mudanças profundas para produzir, de fato, moradia digna para aqueles que mais precisam. Medidas emergenciais:

– fortalecimento da gestão direta dos projetos e obras pelos futuros moradores, destinando 100% dos novos projetos à modalidade MCMV Entidades;
– focar o programa nas famílias com renda menor que três salários mínimos, que representam 70% do déficit habitacional brasileiro;
– associar o programa a uma política nacional de desapropriações, possibilitando assim uma melhor localização urbana dos empreendimentos populares;
– reduzir a margem abusiva de lucro das construtoras no programa, com o aumento das exigências de qualidade e tamanho mínimo das moradias construídas, garantindo que nenhuma habitação tenha tamanho inferior a 55m²;
– aumentar os recursos destinados ao programa.

7. Limitação para a aquisição de imóveis

A dinâmica da concentração de poder e de riqueza no Brasil está associada à concentração proporcional de propriedades e de imóveis que, em grande parte dos casos, sequer cumprem sua função social, servindo apenas especulação. Em nossa proposta, para combater o déficit habitacional e contribuir efetivamente para a desconcentração de riqueza e renda ninguém poderá ter mais do que 5 imóveis em uma cidade, a não ser em casos excepcionais. Com isto, visamos também quebrar o ciclo de especulação que faz os preços dos imóveis explodirem.

8. Lei da Casa Vazia

A quantidade de domicílios vazios nas grandes cidades é imensa e capaz de resolver grande parte do déficit habitacional que as metrópoles acumularam ao longo de anos. Boa parte desses domicílios está localizado em áreas centrais das cidades, abastecidas amplamente por sistemas de transportes públicos e por infraestrutura urbana. Portanto, associada a outras políticas habitacionais, a Lei da Casa Vazia estabelece que imóveis desocupados por mais de dois anos, que estejam comprovadamente a serviço da especulação, com dívidas com o poder público e em áreas onde há grande déficit habitacional, devem ser desapropriados a fim de transformá-los em habitação popular.

9. Política federal de Aluguel Social em áreas centrais

As políticas de aluguel social no Brasil servem, na melhor das hipóteses, como atenuantes para famílias que sofrem com desastres ou remoções forçadas. Ao contrário, deveriam significar instrumentos de combate à favelização e à periferização a partir de programas que forneçam subsídios para que quem tenha menos recursos possa morar dignamente em áreas providas de infraestrutura urbana.

10. Urbanização e regularização de favelas

O processo de expansão das periferias urbanas e de favelização é uma regra geral nas grandes cidades brasileiras. Essas habitações são as que os negócios imobiliários deixam disponíveis para quem tem pouca renda, em geral em áreas onde o mercado formal não pode ou não quer investir. Entretanto, na imensa maioria das vezes as favelas, vilas e outras denominações de habitações chamadas “irregulares”, sofrem um processo pesado de segregação urbana por parte do poder público que as condiciona a uma situação de “não-cidade”. Integrar as favelas à cidade com investimentos de vulto em urbanização e iniciativas concretas para a regularização fundiária, administrativa e patrimonial dessas habitações é uma prioridade e a melhor alternativa para responder ao passivo socioambiental das cidades, preservando empregos, laços territoriais e acesso a equipamentos públicos.

Agradecimentos:

MTST
Vladimir Safatle
Nós da Sul