Programa » Mobilidade e Transportes

A questão dos transportes foi a principal catalisadora das jornadas de junho, que levaram milhares de brasileiros às ruas, rompendo o dique da indignação popular. O PSOL sabe que não é por acaso. A luta contra o aumento das tarifas sempre foi uma prioridade nossa porque o transporte público e de qualidade é uma necessidade estruturante de justiça social e direito à cidade, devendo ser entendido como um direito universal e um dever do Estado assegurado na Constituição.

Por isso, garantir políticas efetivas de mobilidade que desonerem os trabalhadores e a juventude ao máximo – com a perspectiva da tarifa zero – ao mesmo tempo em que incluam outros modais – como a bicicleta, transporte sobre trilhos, sobre a água e o transporte por veículos elétricos (trólebus e bondes) – em uma visão integrada de desenvolvimento das cidades é uma prioridade do nosso programa. Ao mesmo tempo é necessário reorientar tanto a rede urbana quanto a rede de transporte de cargas para alternativas mais racionais ambiental e economicamente.

Prioridades:

a) Garantir transporte público como direito social constitucional;
b) Reduzir e até zerar as tarifas e, ao mesmo tempo, expandir a oferta e avançar na qualidade do serviço;
c) Aumentar a destinação de verbas públicas à mobilidade urbana;
d) Integrar transportes urbanos em um Plano Integrado de Mobilidade, abarcando diversos modais (bicicleta, carro, transporte coletivo e deslocamento a pé) dentro das estruturas de planejamento urbano;
e) Para transporte de cargas, substituir progressivamente o modal rodoviário pelos aquaviário e ferroviário, com frete mais barato e menor consumo de energia;
f) Garantir condições dignas de salário e trabalho aos profissionais de transportes.

Propostas de eixos de ação da União no que se refere à mobilidade urbana e metropolitana:

1. Estabelecer o transporte público como direito social nos termos do artigo sexto da Constituição Federal

A PEC 74 do Senado, que já tem todos pareceres favoráveis, versa sobre o tema e só precisa ser posta em votação. Como já foi aprovada a PEC 90 da Câmara, com o mesmo objetivo, aprovada a PEC 74 está completada a inscrição na Constituição. Garantir o transporte público como direito social constitucional significa avançar para a obrigatoriedade de seu oferecimento pelo Estado bem como a qualidade e a gratuidade.

2. Destinação de ao menos 2,1% do PIB para mobilidade urbana

Destinaremos, conforme proposto pelo IPEA, pelo menos 2,1% do PIB para mobilidade urbana dando prioridade absoluta ao transporte público. A política de amplos subsídios estatais às grandes montadoras e ao transporte individual motorizado como prática dos governos Lula e Dilma, além de reforçar a desigualdade social diminuindo a capacidade de arrecadação do Estado, reforça a lógica de mobilidade crítica e segregação nas grandes metrópoles com os problemas crônicos de trânsito e as deficiências profundas no transporte público.

O dado mais alarmante dessa política falida é a crescente quantidade das mortes em acidentes de trânsito: em 2012 foram 46 mil mortes desse tipo, número que se aproxima cada vez mais das mortes por homicídio. O fortalecimento do transporte público – garantido como direito e financiado pelo Estado – articulado com outros modais não motorizados, como a bicicleta, é fundamental para garantir a todos o direito a cidades mais humanas, ambientalmente justas e economicamente viáveis.

3. Estabelecimento de um Código Nacional de Desempenho dos Transportes Coletivos Urbanos e Metropolitanos

Como desdobramento das diretrizes da LEI Nº 12.587, DE 3 DE JANEIRO DE 2012, denominada Lei da Mobilidade, propõe-se a edição de um Código Nacional do Desempenho dos Transportes Coletivos Urbanos e Metropolitanos que torne efetivas as diretrizes gerais contidas na citada lei. Diferentemente de Planos de Mobilidade ali previstos, o Código proposto tem força de operacionalizar de imediato as características do desempenho dos transportes coletivos urbanos e metropolitanos. Um país não pode prescindir de tais especificações, tal como existe na aviação civil e no trânsito, por exemplo.

Esse Código determinará, por exemplo, que:

– será de cinco o número máximo de passageiros por metro quadrado em qualquer horário;
– o tempo máximo de espera nos pontos de parada será de 4 minutos;
– será obrigatório o uso de ar condicionado nos veículos;
– será proibido o uso de veículos encarroçados sobre chassis de caminhões;
– será obrigatório o uso de câmbio automático;
– os polos geradores de passageiros, sejam de origem residencial, comercial ou de serviços, deverão prover obrigatoriamente serviços de transportes tipo “shuttle”, entre o polo gerador e terminais de transportes coletivos;
– será obrigatório (conforme decreto 5.296 DE 2 DE DEZEMBRO DE 2004) a todos os ônibus a garantia de plena acessibilidade para deficientes;
– será proibido o acúmulo de tarefas dos profissionais dos transportes coletivos.

4. Criação do Fundo Nacional de Financiamento das Tarifas de Transportes Coletivos Urbanos e Metropolitanos

Com recursos provenientes de uma reforma tributária, com ênfase nos impostos diretos e sobre grandes fortunas, além da transformação do Vale-Transportes em Taxa Transportes proporcional ao número de trabalhadores das empresas. Tal fundo ajudará no subsídio das tarifas, em complemento aos subsídios de origem municipal e estadual. Só acessarão o Fundo os municípios e estados que observarem o Código de Desempenho.

5. Criação do Programa Ônibus Sustentável

Estimulando a inovação, fomento e incentivo à fabricação nacional e uso de ônibus movidos a energia elétrica segundo os padrões recentes que prescindem do uso de alavancas captadoras de energia e usam sistema de recarregamento de baterias por modos de indução eletromagnética nos pontos de parada. O mercado brasileiro de ônibus urbanos é de cerca de 100.000 veículos. Os municípios e estados que usarem esse tipo de veículos nos corredores e nas linhas comuns, terão um adicional do Fundo de Financiamento das Tarifas. Paralelamente, condicionado à gratuidade das tarifas, haverá incentivos e financiamento por parte do governo federal a pequenos e médios municípios a comprarem frotas próprias de ônibus.

6. Estabelecimento de padrões de eficiência para a produção de carros brasileiros

Os fabricantes de veículos automotores deverão alcançar metas mínimas de eficiência energética veicular, que serão progressivamente introduzidas de 2018 a 2021, até atingir a meta de 1,22 Mj/Km (megajoules por quilômetro). Se tal eficiência for alcançada, além dos benefícios ambientais, a população brasileira economizaria R$ 287 bilhões em combustível.

7. Integração prioritária e obrigatória da bicicleta aos planos de mobilidade com estímulo ao uso de modais não motorizados como parte da mudança do padrão de deslocamentos urbanos

É necessário incentivar a busca por alternativas de transportes menos impactantes na rede viária, desestimular o uso excessivo do automóvel e ainda reorganizar a utilização do espaço urbano de forma a garantir que deslocamentos, quando necessários, sejam realizados da forma mais racional possível. A integração entre diferentes modais de transporte – com prioridade aos coletivos e aos não motorizados – deve ter tratamento preferencial, em detrimento de intervenções específicas de expansão da infraestrutura existente.

A bicicleta, absolutamente viável para pequenas e médias distâncias, quando integrada a outros modais de transporte permite atingir vários destinos, além de ser um vetor de melhoria ambiental e de saúde. O trajeto por bicicleta multiplica por 15 a zona de influência de uma parada de transporte público. Em estudo da Comissão Europeia, constatou-se que o ciclista pode ganhar um quarto de hora em relação ao ônibus, no seu deslocamento para alcançar uma estação de integração. Para nós, aliada à expansão e prioridade ao transporte público coletivo, o compromisso com a mobilidade ciclística será central. Para tanto, incorporaremos propostas dos movimentos ciclísticos para o desenvolvimento de um programa nacional de mobilidade ciclística que envolva, como sugerido pela União de Ciclistas do Brasil:

– Criar um sistema de pesquisa, monitoramento e avaliação das políticas públicas, da infraestrutura cicloviária e da participação da bicicleta nos deslocamentos, assim como incluir a bicicleta no censo e nas pesquisas domiciliares do IBGE, de modo a subsidiar a elaboração de planejamento para o setor;
– Criar rubrica específica no Orçamento Geral da União, por meio do Plano Plurianual, para custeio e investimentos em mobilidade ciclística, bem como linhas de financiamento aos municípios brasileiros para infraestrutura cicloviária, em montante crescente a cada ano;
– Estabelecer metas claras de aumento da participação da bicicleta na mobilidade urbana e rural, envolvendo todos os setores da administração pública federal, bem como aplicar a bicicleta nas políticas públicas sociais tais como de trabalho, geração de renda, erradicação da pobreza, defesa civil, educação, saúde e moradia;
– Instalar bicicletários adequados em todos os prédios públicos federais, de todas as cidades brasileiras, quando houver espaço disponível, suprimindo, se necessário, vagas de estacionamento de automóveis;

8. Transferência modal do transporte de cargas: de rodoviário para aquaviário e ferroviário

Os modais ferroviário e aquaviário são mais eficientes economicamente e menos poluentes para o transporte de carga. O custo do frete ferroviário é, segundo o DNIT, 50% menor do que o rodoviário, que continua sendo usado pela pressão histórica das grandes empresas automobilísticas. Em nenhum outro país com dimensões continentais como o Brasil (como EUA e Rússia) existe a utilização desse padrão.

9. Integração do Planejamento e Logística de Transportes nacional às realidades de estados, regiões metropolitanas e municípios

Por meio de investimentos em capacitação técnica, humana e financeira de setores do governo, como a Empresa de Planejamento e Logística (EPL), deve-se prover estados e municípios de apoios diretos ao aperfeiçoamento e criação de planos de mobilidade onde estes não existam e integrá-los a um plano comum nacional com otimização dos investimentos e resultados.

10. Estabelecimento e criação, através de legislação pertinente, de ferramentas de democracia direta no planejamento, programação e controle das linhas de transportes coletivos urbanos e metropolitanos

A mobilidade urbana é um dos serviços públicos que mais se presta e exige a democracia direta no estabelecimento de suas políticas, planejamento, programação e controle. A população usuária detém um conhecimento só permitido pela vivência propiciada pelo uso diário dos transportes coletivos.

Cabe ressaltar que das reivindicações das Jornadas de junho de 2013, a questão da mobilidade e das tarifas dos transportes coletivos foi a que menos foi contemplada, na prática, por medidas inovadoras e concretas. O máximo que aconteceu foi a aprovação do REITUP, que desonera as empresas de impostos, contribuições e taxas, supondo que tais renúncias fiscais chegarão ao bolso do usuário pela redução das tarifas. Assim mesmo, poderão reduzir as tarifas em baixos percentuais.

Agradecimentos

Lucio Gregori
Greenpeace
IPEA
Setorial de mobilidade do PSOL