Em mais uma iniciativa da Comissão Externa sobre os feminicídios no Rio Grande do Sul, a deputada estadual Luciana Genro (PSOL) e a deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL) se reuniram com o chefe da Polícia Civil do Estado, o delegado Heraldo Chaves Guerreiro, para debater os principais desafios enfrentados no combate à violência de gênero, especialmente em casos de violência doméstica e perseguição de ex-parceiros. O encontro, que integra as ações da Comissão presidida por Fernanda Melchionna, teve como foco o aperfeiçoamento das políticas de monitoramento e proteção às vítimas, especialmente por meio do uso de tornozeleiras eletrônicas.
A utilização do monitoramento pelos agressores tem sido uma das pautas de maior mobilização e preocupação de Luciana Genro nos últimos meses e, neste sentido, a deputada trouxe ao debate a falta de clareza sobre quem tem a prerrogativa de solicitar a aplicação das tornozeleiras, se o delegado responsável pelo registro da ocorrência, o Ministério Público ou o Judiciário. Além disso, ela questionou os presentes sobre uma possível incongruência nos dados sobre a aplicação da medida e a subutilização dos dispositivos disponíveis.
Foi apontado pelos representantes da Polícia Civil que há dois tipos de sistemas de utilização de tornozeleiras no estado. O utilizado pela SUSEPE, utilizado principalmente para medidas semiabertas ou abertas, e o sistema da Rede Lilás, indicado nos casos de violência contra mulher. Este segundo conta com monitoramento duplo, tanto do agressor quanto da vítima, e permite o disparo de alertas em caso de aproximação indevida, acionando imediatamente a Brigada Militar. Segundo os dados mais recentes apresentados no encontro, atualmente o sistema de proteção às mulheres registra cerca de 2 mil alertas por dia, com mobilização de viaturas para garantir a integridade física das vítimas.
Entretanto, para que o monitoramento seja viabilizado, é necessário o consentimento da vítima, que deve autorizar formalmente a medida e buscar o smartphone que emite os alertas. No entanto, muitas mulheres não concordam com o uso ou, mesmo quando concordam, acabam não retirando o aparelho nas delegacias, o que compromete a efetividade do sistema.
Questionados por Luciana Genro sobre o número de tornozeleiras não utilizadas, os representantes da Polícia Civil explicaram que as comarcas podem solicitar unidades de outras regiões. Quando não há tornozeleiras disponíveis, existem medidas legais que garantem a prisão do acusado por mais 24 horas até a chegada do equipamento na cidade. Todavia, ainda há, em algumas localidades, uma resistência institucional para com o uso das tornozeleiras. “Estamos atuando ativamente para transformar essa cultura e ampliar o uso das tornozeleiras como instrumento de proteção às mulheres em situação de violência”, afirmou a delegada Tatiana Bastos, do Departamento de Proteção a Grupos Vulneráveis (DPGV) da Polícia Civil.
Os representantes da Polícia Civil reforçaram a importância de formalizar as solicitações de tornozeleiras eletrônicas, destacando que esses pedidos são essenciais para mapear com precisão a demanda em todo o estado. Esse mapeamento permitirá uma redistribuição mais estratégica dos dispositivos, priorizando as regiões com maior incidência de violência e necessidade de monitoramento. A polícia se comprometeu a atender todas as solicitações e ressaltou que, quanto mais as medidas forem requeridas e aplicadas, mais eficiente será a logística de alocação dos equipamentos, garantindo a proteção das mulheres.
Necessidade de ações integradas
Outro ponto debatido foi a estrutura de acolhimento. As parlamentares criticaram a rigidez nos horários de triagem das casas abrigo, que muitas vezes impedem que mulheres em situação de risco sejam acolhidas fora do expediente. Após esse horário, as vítimas acabam sendo encaminhadas a albergues, onde também enfrentam situações de vulnerabilidade e violência. A necessidade de flexibilização e ampliação do atendimento foi uma das pautas centrais do encontro e ganhou o apoio dos representantes da Polícia Civil.
A ausência de uma rede conectada entre saúde, educação, segurança pública e assistência social também foi apontada como um entrave para a real proteção das mulheres. “A segurança das mulheres não pode ser tratada como um problema apenas policial. Precisamos de uma ação integrada, com escolas identificando sinais de violência, rede de acolhimento funcionando em tempo integral e investimentos públicos consistentes para garantir proteção”, afirmou Luciana Genro.
A deputada Fernanda Melchionna também destacou o papel da Comissão Externa e a urgência de políticas públicas efetivas e integradas. “O crescimento dos casos de feminicídio exige respostas concretas do Estado. A comissão está ouvindo especialistas, forças de segurança e a sociedade para construir propostas reais de enfrentamento”, informou.
A reunião faz parte de uma série de esforços da Comissão Externa, que ainda promoverá audiências públicas em diferentes cidades do Rio Grande do Sul para ouvir as comunidades, mapear gargalos e cobrar ações efetivas do poder público em todas as esferas.
