Dando sequência aos encontros para debater a intolerância religiosa no Rio Grande do Sul, a deputada estadual Luciana Genro (PSOL) presidiu mais uma audiência pública, desta vez, em Porto Alegre, sobre o tema. Reunindo uma série de lideranças religiosas, o evento contou com a presença de pais e mães de santo da cidade, que relataram episódios de intolerância em diversos espaços, assim como uma falta de ação por parte dos aparatos públicos em relação a estes crimes.
“Apesar de inaceitável, percebemos que a intolerância religiosa é uma realidade no Rio Grande do Sul e, através desses encontros, conseguimos dar voz a comunidade e criar pontes e apontar caminhos concretos para a mudança. Fico feliz que tantas pessoas estejam participando e se organizando para que, juntos, possamos mudar essa realidade”, pontuou a deputada antes da reunião.
Pai Tiago de Bará, que preside a Associação Independente em Defesa das Religiões Afro-Brasileiras (Asidrab), entidade destinada à proteção das religiões afro-brasileiras no Rio Grande do Sul, iniciou as manifestações. “Abrimos essa audiência pública com muito pesar, com a notícia recente de que, na cidade de Mauá, o Pai Leandro de Oyá foi alvejado à queima roupa, em um crime de intolerância religiosa e homofobia”, relatou para consternação dos presentes. “Esse relato choca, mas não é nenhuma novidade para nós, que vivemos esse preconceito diariamente. Ele está fora de risco, mas levou dois tiros na perna. Enquanto isso, o Estado, que deveria nos proteger, tratou o caso apenas como injúria”, compartilhou Pai Tiago de Bará.
As autoridades religiosas também compartilharam inúmeros relatos de perseguição, tanto institucional, através da coerção violenta das forças de seguranças aos serviços religiosos e celebrações da comunidade, como de cidadãos que entendem, por desconhecimento e racismo, as religiões de matriz africana como “do demônio” ou “do mal”.
Se unindo ao sentimento de consternação dos presentes, Luciana Genro pontuou a urgência da revisão da tipificação dos crimes contra as comunidades de matriz africana, especialmente para que assim seja possível mapear de forma oficial a intolerância religiosa no Rio Grande do Sul. Através desses dados, será possível a criação de políticas públicas realmente eficientes no combate ao que a deputada chamou de “grave problema social, que deflagra o racismo estrutural em nossa sociedade”.
“Sem dados oficiais e protocolos claros, o Estado permanece cego diante da realidade do racismo religioso. Precisamos urgentemente de mecanismos que identifiquem e registrem esses casos para que políticas públicas eficazes possam ser implementadas. O apagamento institucional também é uma forma de violência”, declarou.
A deputada também irá enviar um ofício ao Governo do Estado e a Secretaria da Educação questionando sobre as situações relatadas de intolerância religiosa no ambiente escolar e quais são os protocolos instituídos para a situação trazida por Pai Thiago de Oxalá, conselheiro tutelar da região sul e centro-sul da capital, que apresentou ao grupo relatos de famílias praticantes das religiões de matriz africana que o procuram para denunciar episódios preconceituosos nas escolas. Segundo essas famílias, as crianças teriam que “esconder ou tirar as suas guias de proteção” antes de entrarem na sala de aula.
Além dos religiosos de matriz africana, pais e mães de santo, e um arcebispo da Igreja Católica Apostólica Anglicana, Dom Agostinho de Jesus, compuseram também a mesa de debates do evento o Governo do Estado, através das presenças da subsecretaria de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos, Samsara Nyaya, e da Diretora de Igualdade Étnico-Racial, Sanny Figueiredo, e a Defensoria Pública, através da sua ouvidoria. Mais uma vez a Brigada Militar e a Guarda Municipal se fizeram ausentes para o debate. Cachoeirinha e Santa Cruz do Sul também já receberam audiências públicas sobre o tema, e a deputada irá a Pelotas, em parceria com os vereadores Jurandir Silva e Paulo Coitinho, para debater o tema no próximo dia 11, às 19h, no Plenário da Câmara de Vereadores.
Ao fim de todos esses encontros, a deputada estadual irá se reunir com representantes do Ministério Público, com o chefe da Polícia Civil, o delegado Heraldo Chaves Guerreiro, e com o chefe da Brigada Militar, o coronel Cláudio dos Santos Feoli, na tentativa de debater o melhor acolhimento das denúncias relacionadas a intolerância religiosa e o desenvolvimento de protocolos mais eficientes em relação a fiscalização do barulho das cerimônias e a abordagem dos praticantes.