A Frente Parlamentar em Defesa dos Servidores do Sistema Prisional foi instalada nesta quinta-feira (30/03) na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul. A iniciativa, coordenada e proposta pela deputada estadual Luciana Genro (PSOL), busca ser um instrumento para se avançar na valorização dos servidores, bem como no respeito aos direitos dos apenados e na possibilidade real de ressocialização.
“O sistema prisional brasileiro é uma fábrica de tragédias, não cumpre com seu dever constitucional e legal de acolhimento, ressocialização e tratamento penal. Valorizar o policial penal é oferecer melhor atendimento aos apenados. Desvalorizados, os servidores não têm condição de oferecer um atendimento digno,” declarou a deputada.
A partir do primeiro encontro, será construído um calendário de reuniões. Também foi encaminhada a construção de um documento que relate a problemática da perda de direitos referentes à aposentadoria de alguns cargos que compõem o sistema prisional, que será apresentado ao Executivo.
O jornalista, produtor do documentário “Central”, coautor dos livros “Falange Gaúcha” e “Paz nas Prisões, Guerras nas Ruas”, Renato Dornelles, parabenizou a iniciativa da instalação da Frente e relatou a diversidade de situações que já presenciou em sua trajetória. Ele firmou o compromisso de articular a exibição de uma de suas produções em uma atividade junto ao grupo de trabalho, buscando aproximação e humanização do olhar das pessoas para dentro dos presídios.
Luta por valorização e condições de trabalho
Presidente do SINDPPEN, Saulo Basso destacou que o sistema prisional conta com 7.500 servidores em 4 funções diferentes, os quais atendem uma população de 44 mil presos divididos em 153 prisionais. Pontuou as precariedades de estrutura nos presídios, criticou a política privatista do último e atual governo. Ele ainda frisou que o texto que regulamenta a Polícia Penal deixa diversos servidores de fora, resultando em uma grande evasão no quadro, já que os profissionais acabam optando por carreiras em outras áreas.
Já Rogério Mota, presidente da APROPENS, destacou a urgência de toda a comunidade apropriar-se da discussão a respeito de qual sistema e qual política prisional é o pretendido. “É preciso assegurar cada vez mais a valorização do profissional, para que, com as estruturas do estado, possibilite-se o retorno das pessoas em privação de liberdade para o convívio da sociedade,” disse
Luciane Engel, psicóloga e Técnica Superior Penitenciária, apontou que para pensar nos direitos das pessoas privadas de liberdade, é preciso pensar nos direitos dos trabalhadores que atuam no sistema prisional. Recordou que há servidores que ingressaram na Susepe entre 2002 e 2004, e em 2020 tiveram seus cargos retirados da aposentadoria especial: são os técnicos superiores, os agentes administrativos e os monitores em extinção.
“São pessoas que estavam na eminência de se aposentar e por questão de dias, estão há anos esperando, sem sequer uma regra de transição. Não se pode brincar com a vida das pessoas dessa forma. Estamos há 20 anos dentro das casas prisionais, estamos adoecendo pois tínhamos uma expectativa de carreira que não foi cumprida,” desabafou.
A agente penitenciaria administrativa Katia Silva trouxe um relato emocionado sobre sua trajetória como filha de agente que trabalhou na rebelião do central. Ressaltou o alto índice de servidores que vem de família Susepiana. “O RS tem que agradecer o agente penitenciário, se não fossem eles as cadeias tinham caído, as rebeliões teriam sido formadas. Me entristece ver o estado atacar o meu direito, diminuindo minha vontade de trabalhar. Me dediquei ao sistema e ele virou as costas pra mim,” relatou.
O agente penitenciário Ariel Stepanski destacou ainda a necessidade de união da categoria para possibilitar melhorias para todo o sistema. Representando os aprovados nos concursos, Helena Frozza salientou que os aprovados buscam não só entrar no sistema, mas contribuir, e percebem que para atingir o máximo potencial “é preciso ter as mínimas e dignificantes condições de trabalho”.
É preciso repensar o sistema
Representando o Comitê de Combate à Tortura, Cris Vilanova afirmou que trabalhar com sistemas de segurança e prisional são as profissões “mais estressantes do mundo”. Ela destacou a necessidade de avançar em uma política de atendimento à saúde física e mental, de forma biopsicossocial, em um programa que considere a qualidade de vida destes profissionais.
Nilsa Figueiredo conta que, trabalhando no Conselho Comunidade de Porto Alegre, realiza vistorias nas casas prisionais de todo estado, e que hoje são cerca de 800 servidores em licença saúde. “Me preocupa a condição dos servidores, pois como um cuidador, trabalhando em condições degradantes, consegue ter saúde mental para continuar cuidando da população carcerária?” questionou, dizendo que é urgente dar suporte para o apenado, para a estrutura dos presídios e condições de trabalho para os servidores.
Cíntia Luzatto, dirigente do Núcleo de Defesa em Execução Penal da Defensora Pública, destacou a problemática da superlotação nos presídios de forma insalubre, das condições de alojamento, falta de pessoal e de corpo técnico. “Fazemos constar nos nossos relatórios de inspeção as condições que os trabalhadores atuam naquele local e solicitamos junto à direção que sejam tomadas as medidas necessárias,” explica.
Letícia Coimbra, Chefe da Divisão de Projetos, Gerenciamento e Articulação de Políticas Públicas do Departamento de Políticas Penais da Secretaria dos Sistemas Penal e Socioeducativo, já foi policial militar e disse que muitos agentes ainda tem receio de dizer que são policiais penais por não serem valorizados. “Eles acabam puxando pena junto, nesse tempo que contribuem com o serviço público, trabalhando com o que é considerado o submundo, com as pessoas que os outros querem fora da sociedade,” relatou.
Vice-presidente da Comissão Especial de Políticas Criminais e Segurança Pública da OABRS e Conselheiro da ACRIERGS, Luiz Augusto de Mello Pires reforçou o compromisso da Ordem com a cidadania e com a justiça. Ele afirmou que sem a valorização daqueles que atuam nas instituições, não é possível chegar a uma situação que não coloque mais em risco a sobrevivência do próprio estado.
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