Foto: Clóvis S. Prates / HCPA
Foto: Clóvis S. Prates / HCPA

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A deputada estadual Luciana Genro (PSOL) enviou um ofício ao Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) cobrando providências a respeito da existência, na instituição, de funcionários que seriam contra a vacinação para Covid-19. A deputada tem recebido denúncias sobre estes casos, sendo a mais recente delas uma denúncia envolvendo um funcionário do setor de Tecnologia da Informação que seria um militante da causa antivacina. Este servidor estaria diretamente envolvido no protesto violento que grupos bolsonaristas realizaram na Câmara Municipal contra o passaporte vacinal.

“A circulação de colaboradores não imunizados atenta contra a integridade física e moral da coletividade, afrontando as melhores práticas de qualidade e segurança e manchando a boa imagem do Hospital de Clínicas”, considera a deputada.

Luciana Genro tem recebido relatos de servidores do HCPA que já denunciaram internamente os colegas que não se vacinaram, mas que não tiveram nenhum encaminhamento por parte da direção do hospital. A deputada entende que a direção do Clínicas tem autonomia para determinar a obrigatoriedade da imunização de seus funcionários.

“A independência garantida à empresa pública permite que a sua gestão tome as medidas necessárias para evitar que seus colaboradores criem um risco à saúde coletiva. Não há necessidade de regra expressa para tal, basta o dever geral de cuidado que está ainda mais evidente quando se trata de uma unidade de saúde. No caso do HCPA, esse dever toma contornos ainda mais relevantes, pois além de uma referência nacional e um orgulho para o Estado, o Hospital continua sendo uma fortaleza na batalha contra a pandemia”, explica Luciana no ofício enviado à diretora-presidente do HCPA, Nadine Oliveira Clausell.

Confira abaixo a íntegra do ofício enviado ao Hospital de Clínicas:

Porto Alegre, 21 de outubro de 2021.
Ofício n.o 156/2021-BAN
Objeto: Pedido de providências frente a denúncias sobre colaboradores não imunizados.

Prezada Sra. Diretora-Presidente Nadine Oliveira Clausell:

Este mandato parlamentar foi informado, por diversas fontes, que a administração deste hospital teria permanecido inerte diante da existência de colaboradores que se recusaram a ser imunizados contra a COVID-19.

Uma das informações que aportaram veio acompanhada por denúncia análoga encaminhada à ouvidoria do HCPA. O nome do denunciante e número processo não serão informados, pois este ofício é público e pode comprometer o informante. Na resposta à demanda, a ouvidoria diz que nada pode ser feito em relação a esses colaboradores, citando como argumentos:

  1. que não há orientação formal do PNI ou do Ministério da Saúde para vacinação compulsória; e
  1. que a NR32 indica tão somente que o profissional deve receber esclarecimento adequado e, caso mantenha a decisão de recusa, deve assinar termo no Serviço de Medicina Ocupacional.

A respeito dos fundamentos para a negativa de ação cabem algumas observações, a começar pela desnecessidade de orientação formal para que a administração exija a vacinação de seus colaboradores.

A independência garantida à empresa pública permite que a sua gestão tome as medidas necessárias para evitar que seus colaboradores criem um risco à saúde coletiva. Não há necessidade de regra expressa para tal, basta o dever geral de cuidado que está ainda mais evidente quando se trata de uma unidade de saúde. No caso do HCPA, esse dever toma contornos ainda mais relevantes, pois além de uma referência nacional e um orgulho para o Estado, o Hospital continua sendo uma fortaleza na batalha contra a pandemia.

Na ação judicial n. 1000122-24.2021.5.02.0472, por exemplo, o TRT2 chancelou a demissão por justa causa de auxiliar de limpeza que recusou a imunização, entendendo que a negativa à ordem de vacinação pela administração é ato de indisciplina e insubordinação passível de demissão. Assim argumentou o Tribunal:

“A despeito das alegações da reclamante no sentido de que não poderia ser obrigada a tomar a vacina, porque não existe lei que a obrigue, é preciso consignar que em 07/02/2020 foi publicada a lei 13.979/2020, que dispõe justamente sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública mundial deflagrada do novo coronavírus. Veja-se que o referido regramento, previu, em seu artigo 3o, inciso III, a possibilidade de realização compulsória de vacinação e outras medidas profiláticas baseadas em evidências científicas.
[…]
Ademais, convém destacar que o C. STF já se manifestou no sentido de
que a vacinação obrigatória se afigura como conduta legítima, desde que as medidas profiláticas observem os critérios constantes do regramento supracitado, em especial o direito à informação, ao tratamento gratuito, entre outros, conforme se infere da decisão transcrita pelo magistrado de origem na fundamentação da sentença prolatada no primeiro grau.
[…]
A bem da verdade, considerando a gravidade e a amplitude da pandemia, resta patente que se revelou inadequada a recusa da empregada que trabalha em ambiente hospitalar, em se submeter ao protocolo de vacinação previsto em norma nacional de imunização, e referendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), sobretudo se considerarmos que o imunizante disponibilizado de forma gratuita pelo Governo (vacina), foi devidamente aprovado pelo respectivo órgão regulador (ANVISA). Desse modo, considerando que a reclamada traçou estratégias para a prevenção da COVID19, divulgou informações e elaborou programa de conscientização para assegurar a adoção de medidas protetivas e a vacinação de seus colaboradores, não se mostra razoável aceitar que o interesse particular do empregado prevaleça sobre o interesse coletivo, pois, ao deixar de tomar a vacina, a reclamante realmente colocaria em risco a saúde dos seus colegas da empresa, bem como os demais profissionais que atuam no referido hospital, além de pacientes, e seus acompanhantes.”

No que se refere à NR32, deve-se observar que ela fala (no item 32.2.4.17.4) em dever de seguir as recomendações do Ministério da Saúde. Isso não significa que, na ausência de recomendação, a determinação de imunização esteja inviabilizada. Na existência de uma lacuna orientativa, como é o caso, cabe à administração tomar as medidas que considerar as mais adequadas. O que não pode é ir contra a recomendação. Como, até então, não existe recomendação vedando a imunização compulsória sob pena de responsabilização, não se pode utilizar a NR para afastar a possibilidade de ação.

Por fim, importante apontar que a eventual existência de colaboradores não vacinados com anuência da administração viola diversas das obrigações do Código de Conduta e Integridade do HCPA, em especial:

“4. Exercer suas atribuições com zelo e dedicação, observando as melhores práticas de qualidade e segurança
[…]
7. Respeitar a integridade de todas as pessoas com as quais se relacione no âmbito institucional.
[…]
10. Preservar o nome e a boa imagem do HCPA” (Capítulo III)

Ademais, a circulação constante de pessoas não imunizadas no ambiente hospitalar também pode ser considerada desvio grave, conforme prevê o Código:

“11. Desrespeitar a integridade física e moral de qualquer pessoa no âmbito do hospital.” (Capítulo VI)

A título de exemplo, alguns dos relatos indicaram que um dos colaboradores não imunizados, militante da causa anti-vacina, teria continuamente circulado em áreas sensíveis, próximas à emergência, sem máscara – o que é gravíssimo sob diversos prismas.

Assim sendo, considerando que cabe à Diretoria a coordenar a política administrativa e de pessoal (Estatuto, art. 66, I e IV), bem como a de gerir o Código de Conduta e Integridade (Código, IX, 1), encaminho-lhe o presente ofício para solicitar que, caso procedentes as informações, sejam tomadas as medidas cabíveis, visto que a circulação de colaboradores não imunizados atenta contra a integridade física e moral da coletividade, afrontando as melhores práticas de qualidade e segurança e manchando a boa imagem do HCPA.

Saudações cordiais,

Luciana Genro
Deputada Estadual