COMPROMISSO DE PORTO ALEGRE
Os participantes do 5° Encontro Latino-Americano pela Memória, Verdade e Justiça – “CUMPRIR COM A VERDADE”, reunidos na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, na cidade de Porto Alegre, entre 30 de março e 1° de abril de 2012, aos 48 anos do golpe de Estado no Brasil, concordam em declarar que nossos Países devem respeitar e aplicar o direito internacional e as resoluções dos organismos responsáveis pela sua aplicação e que também devem cumprir com a Verdade, esclarecendo as graves violações aos direitos humanos ocorridas durante as ditaduras vigentes na região, na segunda metade do século XX.
Como nos encontros celebrados durante todo o ano de 2011, em Buenos Aires, Montevidéu, Santiago do Chile e La Paz, nas datas dos aniversários de seus golpes de Estado, nos comprometemos a levar adiante, onde quer que seja, o caráter supranacional das convenções e dos tratados internacionais a que nossos Estados tenham aderido, os quais devem ser incorporados às nossas constituições, admitindo uma hierarquia equivalente na medida em que essas normas acolhem o direito das pessoas, povos e permitem a convivência entre as nossas nações.
Comprometemo-nos também a confrontar toda a lei, decreto ou norma que possa reduzir, anular ou restringir a proteção aos direitos humanos, e propugnar que os Estados criem legislações nacionais para assegurar a execução e o cumprimento das sentenças penais dos organismos internacionais, sem que possam ser invocados conceitos de anistia, prescrição, irretroatividade da lei penal, coisa julgada, “ne bis in idem”, ou de qualquer excludente similar de responsabilidade que obstrua a investigação e a punição dos crimes contra a humanidade, conforme já estabelece a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos.
À luz das experiências recolhidas em vários de nossos países, comprometemo-nos a exigir que as Comissões da Verdade, que devem ser constituídas para o esclarecimento das violações dos direitos humanos, tenham a autonomia e o poder que lhes permitam realizar plenamente o seu trabalho, e que as instituições ou entidades criadas pelos nossos Países para a proteção e a vigilância dos direitos humanos tenham a autonomia necessária para atuar com independência a fim de que aqueles fatos nunca mais se repitam.
Reiteramos o compromisso de exigir a abertura de todos os arquivos de Estado, particularmente aqueles dos serviços de inteligência das forças armadas (necessariamente submetidas ao poder civil), para reconstruir o passado, e, simultaneamente, exigir a aprovação de normas de “habeas data” que protejam as vítimas e denunciem os violadores. Neste sentido, comprometemo-nos com a luta, desde o âmbito de nossas ações, para exigir de nossos representantes “uma vontade política” que transcenda os programas de um governo e que venha a constituir uma política de Estado para a defesa dos direitos humanos.
Conhecedores de todos os horrores que sofreram milhões de latino-americanos em centros clandestinos de tortura e de desaparição, em campos de concentração, nas cadeias e quartéis, redobramos o nosso comprometido esforço para que os agentes de Estado, assim como os seus cúmplices civis, que violaram os direitos humanos sejam processados e punidos com penas proporcionais aos seus crimes. O Estado tem a obrigação de impedir crimes de guerra, genocídios e crimes de lesa humanidade.
Os Estados devem também reparar integralmente as vítimas das graves violações ao direito internacional humanitário, acatando e cumprindo a Resolução Internacional nº 60/147 da Organização das Nações Unidas (ONU), de 2005, quando se estabeleceu o direito à reparação integral às vítimas com medidas adequadas: restituição, indenização, reabilitação, satisfação e garantias da não repetição e da prevenção, o que também contribui para garantir que nunca mais ocorra o terrorismo de Estado.
Apresentamos nossa solidariedade aos ex-presos políticos das ditaduras na Bolívia, os quais esperam o cumprimento, por parte do Estado, da Lei 2.640, de reparação, dívida ainda pendente com o povo boliviano.
Comprometemo-nos, também, a apoiar o esforço do Estado Argentino de investigar os crimes de lesa humanidade que tiveram por vítimas todos os soldados combatentes, em 1982, nas Ilhas Malvinas (que constituem uma parte integral e indivisível do território argentino, cuja soberania se vê violentada pela ocupação colonialista do Reino Unido). Entendemos que tais crimes foram cometidos por seus superiores formados na Doutrina de Segurança Nacional, ministrada pela Escola das Américas para implantar a tortura, a desaparição de crianças e as violações massivas de direitos humanos de nossos povos. Tal prática afastou os Estados dos ensinamentos dos Libertadores de nossa América.
Convocamos, finalmente, ao 6° Encontro Latino-americano pela Memória, Verdade e Justiça que se celebrará no Paraguai, em lugar e em data que serão comunicadas oportunamente.