Leis absurdas
Há leis, no Brasil, que não pegam. Não são cumpridas. Nem aplicadas. Há outras piores, absurdas. Melhor seria quem não pegassem. A legislação eleitoral, por exemplo, é pródiga em monstrengos. A deputada federal Luciana Genro (PSOL) foi atingida de uma vez só por duas dessas melancias jurídicas. Apesar de ter feito quase 130 mil votos na eleição de outubro, ela ficou de fora. Perdeu até para quem não chegou a 30 mil votos. É a tal lei da proporcionalidade, do coeficiente eleitoral. A Câmara dos Deputados perdeu uma das pessoas mais combativas, coerentes e competentes da política nacional. De quebra, com a eleição de Tarso Genro, pai de Luciana, para o governo do Rio Grande do Sul, ela está inelegível no Estado. Só pode concorrer à Presidência da República.
Eu tenho as minhas leis: numa democracia, nenhuma lei pode restringir meus direitos políticos individuais se eu não tiver cometido qualquer irregularidade. Ninguém poderia ter sua liberdade de ser candidato limitada pelo fato de seu pai já ter cargo eletivo. A medida existe para impedir o uso da máquina em favor do familiar? Remédio ridículo. Mata-se o paciente para impedir que ele seja auxiliado. Que se criem mecanismos para impedir ou punir o uso da máquina pública em favor de parentes. Luciana Genro faz oposição ao partido do seu pai. Sempre teve voo próprio. Foi expulsa do PT. Não é filhinha de papai. Enquanto isso, no Maranhão, toda a família Sarney se elege debochando das leis com subterfúgios baratos. José Sarney concorre pelo Amapá. Só há uma lei boa na democracia no que se refere à escolha dos representantes: o povo decide. Cada cabeça, um voto. Deve ganhar quem somar mais votos, sendo filho, irmão, marido ou amante.
Hoje, na Faculdade de Direito da Ufrgs, às 18h30, acontecerá um evento em favor da possibilidade de Luciana Genro ser candidata à vereança em Porto Alegre. Grandes figuras de vários partidos prometem estar lá: Sérgio Zambiazi, Ana Amélia Lemos, Pedro Simon, José Fortunati e o governador eleito Tarso Genro. A relação de Tarso e Luciana é muito bonita. Demonstram muito carinho na relação pai e filha, respeitam-se como adversários políticos e comportam-se, um em relação ao outro, na esfera pública, com uma elegância extraordinária. O legislador brasileiro precisa acordar para coisas simples: nada pode cercear o direito individual de participação no espaço público. Ser parente não pode virar privilégio. Nem ônus. Temos muitas leis burras.
Só deveria ser dividido com outros candidato o voto na legenda. Voto nominal pertence ao indivíduo votado. Quem fizer mais, deve ganhar. Sem formulismos. A lei da fidelidade partidária é suficiente para impedir que o individuo eleito vá embora com seus votos. É outra conversa. Certo é que Porto Alegre não pode prescindir da oportunidade de ter Luciana Genro como vereadora. O meio jurídico sabe que essa legislação precisa mudar. Ou a interpretação do texto legal. A vida costuma ser mais complexa do que certas leis aprovadas para corrigir distorções, criando novos defeitos e metástases legais.