A OPERAÇÃO MERCARI
Banrisul e agências de propaganda no alvo da PF
A apreensão de R$ 3,4 milhões e a prisão do superintendente de marketing do banco estatal gaúcho e de dois dirigentes de agências publicitárias, suspeitos de superfaturamento de contratos, colocaram ontem a Polícia Federal no centro de uma polêmica, a um mês da eleição para o governo do Estado. A ação atinge uma instituição cujos cargos de confiança são ligados a partidos de dois dos principais candidatos ao Piratini.
A 30 dias das eleições, uma ação da Polícia Federal (PF) na manhã de ontem provocou constrangimento na cúpula do Banrisul, comoção no mercado publicitário e reação no meio político gaúcho. Um dirigente do banco e dois diretores de agências de propaganda foram presos em Porto Alegre por suposto envolvimento em desvios de recursos que teriam gerado prejuízo de cerca de R$ 10 milhões ao Banrisul.
A operação, denominada Mercari (comprar para vender, em latim), também sacudiu a cena eleitoral. O Banrisul é subordinado a uma candidata ao governo do Estado, a governadora Yeda Crusius, do PSDB, e, no período sob investigação o banco estava sob controle de uma pessoa indicada pelo PMDB, partido de outro candidato ao Piratini, José Fogaça. Os dois são adversários de Tarso Genro, ex-ministro da Justiça, que chefiava a PF até sete meses atrás e concorre ao Piratini, pelo PT.
A ação de ontem foi conduzida por 76 policiais federais, além de integrantes do Ministério Público Estadual e do Ministério Público de Contas. As investigações apontam que ações de marketing do Banrisul, contratadas junto a agências publicitárias, seriam superfaturadas via empresas terceirizadas. Os verdadeiros executores dos serviços receberiam quantias bem menores do que a verba desembolsada oficialmente pelo banco – e parte do dinheiro seria desviada, afirma a PF.
A investigação começou há 11 meses, quando uma testemunha-chave afirmou que dirigentes do banco receberiam propina para aceitar orçamentos publicitários superfaturados. Conforme o depoente, o serviço é aprovado com um valor, quando, na verdade, custaria muito menos.
– Um projeto que custaria em torno de R$ 350 mil foi faturado em R$ 546 mil – exemplificou a testemunha, protegida por policiais porque teria recebido ameaças.
Três prisões em flagrante
Os policiais prenderam em flagrante dois dirigentes de agências publicitárias: Armando D’Elia Neto, da DCS, e Gilson Storck, da SLM, além do superintendente de marketing do Banrisul, Walney Fehlberg. A justificativa da PF: eles guardavam, em suas casas, dinheiro sem origem identificada (o equivalente a cerca de R$ 3,4 milhões, em dólares, libras, reais e euros).
Manter dinheiro em casa não é crime, mas nenhum dos três soube (ou quis) explicar a origem de tamanha quantia não declarada. Parte do dinheiro apreendido na residência do superintendente do Banrisul estava envolvida em cintas de papel com a inscrição “Tesouraria DCS”.
Os publicitários foram presos por suspeita de lavagem de dinheiro, e o funcionário do Banrisul, por peculato (quando servidor público desvia valores em razão do cargo que exerce).
O delegado Ildo Gasparetto, superintendente regional da PF, nega que a ação tenha motivação política:
– Não é porque a eleição será dentro de um mês que a PF e outros órgãos deixarão de trabalhar.
Por que então a PF entrou no caso, se o banco é estadual? De acordo com Gasparetto, quando detectou indícios de crimes federais, como lavagem de dinheiro e evasão de divisas, o Ministério Público acionou a PF.
Ainda pela manhã, a governadora e candidata Yeda Crusius (PSDB) escreveu em seu Twitter: “PF no Banrisul. Muito estranho… É estadual. Já vi esse filme antes, roteiro do velho jeito”.
Outro candidato a governador, Pedro Ruas (PSOL) foi à sede da PF, acompanhado da deputada Luciana Genro (PSOL) e gravou as explicações dadas na entrevista para usar no programa eleitoral.
Tarso Genro (PT) adotou a prudência e disse que não vai comentar o episódio. José Fogaça (PMDB) também não se pronunciou.
A operação aconteceu ao amanhecer, com policiais cumprindo 11 mandados de busca em residências de dirigentes de agências, do diretor do banco e de pessoas terceirizadas para o serviço. Um dos diretores da SLM foi despertado por um telefonema, no qual o interlocutor disse ser da PF e assegurou que não era um trote. Aconselhou que a porta da agência, no centro da Capital, fosse aberta. O empresário concordou.
No bairro Moinhos de Vento, três viaturas da PF estacionaram diante do prédio da agência de publicidade DCS. Foram apreendidas 50 caixas de documentos.
ILDO GASPARETTO
Superintendente regional da PF
“ O objetivo é que o dinheiro retorne. O Banrisul é vítima disso. É uma quadrilha que se colocou com funcionários públicos e privados, que retiraram dinheiro que deveria estar em aplicações do banco para uso particular.”