Serra, Dilma e Marina: mais do mesmo
Na terça-feira, 25, a Confederação Nacional da Indústria promoveu encontro de três pré-candidatos à Presidência da República: José Serra (PSDB), Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (PV). Todos eles defenderam a reforma tributária.
Interessante observar que, nos últimos 15 anos, os governos FHC e Lula – dos quais participaram todos os três pré-candidatos presentes no evento – jamais fizeram a tão almejada reforma tributária. Ou melhor: fizeram, sim, mas uma reforma tributária silenciosa, que foi paulatinamente onerando cada vez mais os trabalhadores e consumidores, aumentando os tributos sobre o consumo. De 1995 a 2008, a carga tributária aumentou 7,6% do PIB (de 26,7% para 34,3%), às custas principalmente do aumento dos tributos incidentes sobre o consumo e a renda dos assalariados, devido às imposições contidas no acordo com o FMI firmado em 1998.
E para que serviu esse aumento colossal dos tributos? Principalmente para garantir o pagamento de juros e amortizações da dívida, que chegaram em 2008 ao montante de 9,4% do PIB, mesmo excluindo-se a rolagem, ou seja, o pagamento de amortizações por meio da emissão de novos títulos.
Isso é: caso não existisse esse colossal gasto de 9,4% do PIB com o endividamento, não teria sido necessário aumento algum na carga tributária nestes últimos 15 anos. Porém, nenhum dos três pré-candidatos ao evento tocou nesse assunto.
O pré-candidato José Serra criticou os juros altos, a carga tributária excessiva e o baixo volume de investimentos. Porém, cabe ressaltar que durante o governo no qual ele foi ministro do Planejamento, as taxas de juros foram a mais de 40% ao ano em alguns momentos, e a carga tributária aumentou de 27% do PIB para 32,3% do PIB.
No que se refere aos investimentos federais, em todos os últimos 15 anos os investimentos foram muito menores que os gastos com a dívida, dentro da política do FMI. De 1995 a 2002 (período FHC), o “Grupo de Natureza de Despesa” dos investimentos foi, em média, de 0,79% do PIB, enquanto no período de 2003 a 2009 (período Lula) tal percentual foi ainda mais baixo, de 0,54% do PIB em média.
Já a pré-candidata Dilma Rousseff garantiu ao mercado a “manutenção dos contratos”, alegando que se os mesmos forem revistos, isso gerará “turbulência generalizada”. Sobre esse tema, cabe ressaltar que, assim como na “Carta ao Povo Brasileiro”, escrita por Lula em 2002, o compromisso de “manter os contratos” se traduz, em bom português, a “manter o pagamento dos contratos da dívida pública, mesmo que eles estejam cobertos de ilegalidades, sem a realização da auditoria da dívida prevista na Constituição, e impedindo a garantia dos direitos sociais, também previstos na Constituição”.
Ora, se a intenção é “manter os contratos”, por que violar o contrato mais importante do país, que é a Constituição? O caos na saúde, na educação, na segurança pública, nas estradas e em diversas outras áreas sociais já não representam uma turbulência generalizada?
Já Marina Silva, quis marcar suas diferenças em relação a José Serra e a Dilma: “A autonomia do BC deve permanecer. (…) Hoje se controla a inflação apenas com a elevação de juros, praticamente, mas sem reduzir gasto público.” Ou seja: a pré-candidata do PV defende propostas ainda mais neoliberais que seus oponentes, como a autonomia do Banco Central e a redução ainda maior dos gastos sociais.
Tal “autonomia do BC” significa fazer com que o Banco Central não seja comandado pelo governante eleito pelo povo, mas pelo próprio mercado financeiro que, conforme demonstrou a CPI da Dívida, é maioria nas reuniões que definem as variáveis consideradas pelo BC na definição sobre as taxas de juros.
Marina também defendeu o câmbio flutuante, o regime de metas de inflação e a “estabilidade fiscal”. Em bom português: os capitais continuarão a fluir com total liberdade, para ganhar as maiores taxas de juros do mundo (estabelecidas a pretexto de se controlar a inflação) e sendo generosamente pagos, com a maior parcela do orçamento.
Enquanto faz superávit primário, governo veta fim do fator previdenciário e reajuste dos aposentados
Nesta semana, a grande imprensa noticiou o “superávit primário” do governo federal obtido em abril, de R$ 16,5 bilhões, como se isso fosse “o melhor resultado em dois anos”. Ou seja: na visão do governo, reproduzida pela imprensa, é bom fazer “superávit primário”, ou seja, reservar recursos para o pagamento da dívida.
Outros meios de comunicação trataram o assunto dizendo que as contas ficaram “no azul”, dando a entender que o governo estaria sendo “responsável” e que as contas estariam indo bem. Porém, o governo adota a seguinte estratégia: divulgou o superávit primário federal, mas nas tabelas disponibilizadas ao público, não divulga os gastos com o endividamento, que fazem tal “superávit” se transformar em um gigantesco déficit.
O secretário do Tesouro, Arno Augustin, ficou “eufórico” com esse “superávit primário” em abril, e garantiu o cumprimento da meta de superávit de 3,3% do PIB em 2010, o que significa cerca de R$ 110 bilhões. Para termos uma noção do que significa esse valor, basta dizermos que ele representa 65 vezes o custo anual do aumento do reajuste (de 6,14% para 7,7%) para os aposentados que ganham mais de um salário mínimo, reajuste esse tão temido pelo presidente Lula e os ministros da área econômica.
Enquanto o país destina R$ 110 bilhões para os rentistas, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou que, para garantir R$ 1,7 bilhão para o reajuste de 7,7% para os aposentados, outros gastos sociais terão de ser cortados. Ou seja: não se mexe nos gastos financeiros, mesmo que eles sejam 65 vezes superiores. É a supremacia total do setor financeiro sobre as demandas urgentes do povo brasileiro. O ministro afirmou que a Previdência não tem condições de dar esse aumento, ignorando que todos os anos a Seguridade Social apresenta superávits de dezenas de bilhões de reais. Mantega também afirmou que tal reajuste pode aumentar o consumo dos aposentados, gerando inflação.
Ou seja: existiria uma enorme ameaça de inflação se os aposentados gastarem R$ 1,7 bilhão a mais por ano, mas não há problema algum em se gastar R$ 380 bilhões em 2009 com juros e amortizações da dívida para os rentistas gastarem à vontade. Além do mais, conforme mostrou a CPI da Dívida, esse raciocínio do ministro exclui a possibilidade do governo fomentar investimentos produtivos, que poderiam aumentar a oferta de produtos, contrabalançando o alegado aumento da demanda.
Governo Lula prejudica aposentados… também na Europa
Enquanto alega não ter R$ 1,7 bilhão para o reajuste dos aposentados, o mesmo governo disponibiliza US$ 4,5 bilhões (cerca de R$ 8 bilhões) para o pacote do FMI para a Europa. Tais recursos são provenientes das reservas internacionais, que são obtidas às custas de endividamento interno, que paga os maiores juros do mundo. Dessa forma, o governo brasileiro consegue trabalhar contra os aposentados brasileiros e europeus ao mesmo tempo, pois contribui para um pacote de imposição de severos cortes de gastos sociais contra os trabalhadores e aposentados da Europa.