PODER DAS TECLAS
Sarney fica refém do PT e do PMDB
A continuidade do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), no cargo está basicamente nas mãos de dois partidos: além do próprio PMDB, o PT pode ser o fiel da balança. Os líderes petistas vão conversar com o senador hoje.
Ontem foi o dia mais duro para Sarney desde que a crise teve início. Ainda à tarde, a bancada do PSDB referendou o pedido para que o presidente do Senado se licencie temporariamente do cargo.
O líder tucano no Senado, Arthur Virgílio (AM), voltou a subir na tribuna do plenário e disse que Sarney precisa se afastar para desfazer a “central de chantagem” na qual teria se transformado o Senado. Segundo Virgílio, a permanência de Sarney no comando é inviável e desgasta toda a instituição. O DEM e o PDT também se voltaram contra o presidente do Senado.
À noite, Sarney se reuniu com seu principal apoiador, o ex-presidente da Casa Renan Calheiros (PMDB-AL). Os dois aguardavam o resultado da reunião do PT, que analisaria a possibilidade de seguir apoiando Sarney na presidência. O resultado do encontro descontentou o presidente: enquanto Sarney esperava apoio incondicional dos petistas, integrantes do partido preferiram esperar por uma conversa com ele, marcada para hoje de manhã, para definir posicionamento.
Na teia de processos contra o presidente do Senado no Conselho de Ética, Calheiros acabou sendo incluído ontem na representação aberta pelo PSOL por quebra de decoro parlamentar.
Vozes do Twitter atordoam Senado
Larissa Magrisso
Minutos antes de anunciar à imprensa o resultado da reunião do DEM que decidiu apoiar o afastamento temporário do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), o líder democrata na Casa, Agripino Maia (RN), antecipou sua posição a um grupo de 1,2 mil pessoas. Eram seus seguidores no Twitter, rede social que assistiu ontem ao ápice do movimento Fora Sarney (ou #forasarney, na linguagem dos tuiteiros).
Agripino sabia o que estava fazendo. Em poucos minutos, sua mensagem foi repassada pelo apresentador do CQC Marcelo Tas, dono de um dos perfis mais populares do país no Twitter, a seus 119,7 mil seguidores. O tema foi comentado por anônimos e também por famosos como o apresentador Luciano Huck, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) e até pelo ator americano Ashton Kutcher, que na noite passada havia dado um puxão de orelha no brasileiro Marcos Mion. O apresentador insistia para que Kutcher, uma espécie de Midas do Twitter que confere popularidade a tudo que comenta, mencionasse o #forasarney na rede. O ator respondeu que não votava no Brasil (veja o quadro).
Nem só da busca por popularidade para o assunto é feito o movimento. O site www.forasarney.com.br, que tem também perfil no Twitter, se propõe a ser uma central de informações e desabafos de insatisfeitos com os rumos do Senado. Um dos criadores do site, o paulista Moacir Sousa, 52 anos, morador de Porto Alegre, conta que, após ter participado de movimentos como as Diretas Já e o Fora Collor, encontrou na internet a ferramenta ideal para dar voz a protestos. Até ontem, mais de 7 mil pessoas já haviam publicado manifestações na página.
Recentemente descoberto por políticos brasileiros como ferramenta para se manter sintonizados com os eleitores, o Twitter continua ignorado pelo próprio Sarney, que já anunciou que não terá um perfil e mandou tirar do ar uma página falsa com seu nome. Por meio de sua assessoria de imprensa, afirmou ontem que “não tem ninguém fazendo pressão” para que peça licença.
Como a rede social funciona
O TWITTER
– O microblog Twitter é uma rede social que permite aos usuários que enviem e leiam comentários de outros contatos
– As atualizações são exibidas no perfil do usuário em tempo real e também enviadas a outros usuários que tenham assinado para recebê-las
– Os textos têm até 140 caracteres, e por isso a rede é também conhecida como microblog
– Recentemente, o Twitter tem atraído também políticos
OS TRENDING TOPICS
– Ao comentar um assunto, os usuários identificam o tema com o sinal #
– Os temas mais populares são chamados de “trending topics” e aparecem em uma lista
– Um dos objetivos da campanha #forasarney no Twitter é também fazer com que o tema figure nos trending topics, o que aconteceu na noite de segunda-feira. Ontem, o #forasarney apareceu também no www.whatthetrend.com, site que mede os assuntos mais quentes da rede social.
Comparação com Irã gera críticas
Comparações do #forasarney às discussões no Twitter que mobilizaram o mundo e deflagraram uma série de protestos pelo Irã após a reeleição de Mahmoud Ahmadinejad geraram críticas na rede. Jornalista do Maranhão e uma das vozes anônimas mais atuantes contra Sarney no Twitter, Sarita Bastos lembra que, no Irã, o microblog foi uma ferramenta que levou a população às ruas, o que não aconteceu no Brasil:
– O #forasarney, apesar de ter repercussão no Twitter e em blogs, ainda precisa ganhar outros espaços para atingir a sociedade que não está online. Os políticos devem se sentir vigiados.
KLÉCIO SANTOS
Junta-cadáveres
Os escândalos envolvendo a família Sarney aprofundaram a crise de identidade que existe no Senado. O DEM, que ajudou a entronar José Sarney na presidência da Casa, agora engrossa o coro dos que pedem seu afastamento. O líder do partido, José Agripino Maia, admitiu que age mais por pressão da sociedade e do que por convicção política.
– Tomamos essa decisão não por gosto, mas pelo interesse de entrar em sintonia com a opinião pública – justificou Agripino.
O DEM, na verdade, se encontra na posição em que o PT gostaria de estar. Os petistas selaram uma insólita aliança com os tucanos para derrotar Sarney na disputa pelo comando da Casa. Agora, o partido se vê constrangido diante do apoio incondicional que o presidente Lula empresta ao maranhense. Por trás desse vai e vem há um interesse eleitoral muito maior do que a busca pelo esclarecimento das falcatruas. Lula quer o apoio do PMDB à campanha de Dilma Rousseff. É justamente por conta da postura de Lula que o DEM procura se afastar do antigo aliado.
Se associando a PSDB, PDT e PSOL na exigência pelo afastamento, os democratas esperam deixar para o governo o desgaste pela solidariedade a Sarney. A situação, porém, é tão caótica que até mesmo o tucano Arthur Virgílio, um dos mais contundentes críticos da gestão Sarney, também caiu na teia de absurdos do Senado, admitindo que sustentou um funcionário fantasma no seu gabinete.