Foto: Carlos Macedo / Agencia RBS
Foto: Carlos Macedo / Agencia RBS

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Por Luciana Genro

O Tallysom, 16 anos, filho da Márcia, moradora da Restinga, morreu. Foi assassinado com cinco tiros. Ela acha que ele estava devendo para o tráfico. Desesperada, já tinha pedido ajuda. O desabafo foi feito em reportagem publicada na edição desta sexta-feira (29/04) de Zero Hora:

– Pedi ajuda ao Conselho Tutelar, ao Ministério Público, à Assistência Social. Queria tirar ele daquela vida, mas não tinha ninguém para dizer: vamos fazê-lo voltar à vida, vamos mostrar que ele é importante.

Ela também se sente culpada por não ter conseguido dar a ele, e aos seus outros dois filhos, o que o dinheiro farto do tráfico propiciava:

– No velório, dizia para ele: Me perdoa por tudo o que não consegui fazer. Fico pensando se não fui eu que deixei de dar as coisas e ele foi buscar lá fora? Eles olham uma corrente, um tênis, um telefone e pedem para mim. Não posso, tenho que dar uma coisa para um e para o outro igual. Mas a droga dá.

É a própria Márcia quem diz: “Não sou a única nesta dor”.

São milhares de mães que têm perdido a disputa com o tráfico. A disputa pelos seus filhos, em uma rotina diária de tragédias envolvendo pessoas que só se tornam visíveis quando ganham as páginas policiais.

A principal matriz criminal, o tráfico de armas e drogas, “recruta jovens sem perspectiva e esperança; embrutece-os; neutraliza sua rebeldia saudável; potencializa o desespero adubado pela autoestima devastada; canaliza para a barbárie sua coragem audaciosa; trunca, embota e perverte seu espírito crítico; e os submete à moenda de um círculo infernal, cuspindo o caroço de suas vidas antes que amadureçam, substituindo-os como peças descartáveis.” (Extrato do capítulo 8 do livro “Legalidade Libertária”, de Luiz Eduardo Soares – Lumen-Juris, 2006)

O Tallysom é mais um triste exemplo da falência da política de “segurança” baseada na chamada guerra às drogas. Ele será facilmente substituído por outro jovem ávido por consumir os produtos oferecidos todos os dias nas propagandas e vitrines, mas negados à imensa maioria que, muitas vezes, mal tem o que comer.

As palavras da Márcia mostram bem o que o antropólogo Luiz Eduardo Soares sempre insiste em dizer. É preciso mostrar a estes jovens que eles são importantes. É preciso disputar com o tráfico, um por um, tentando oferecer a eles o que buscam no tráfico, que não é apenas dinheiro, mas reconhecimento, pertencimento, importância.

Para isso são necessária políticas públicas voltadas especialmente para estes jovens vulnerabilizados, alvos fáceis das gangues.

Mas não vou falar disso agora. Só queria dar à morte do Tallysom alguma importância que lhe foi negada em vida.