Por Luciana Genro
O Brasil vive um momento de extrema gravidade. Uma profunda crise econômica, aliada a uma grave crise política trazem sofrimentos gigantescos para o nosso povo. Explicitei, na campanha eleitoral presidencial, as profundas divergências existentes entre mim e a Presidenta Dilma Rousseff, bem como entre os nossos partidos.
Quando Dilma ingressou no PT, eu e outros companheiros estávamos sendo punidos e expulsos por não concordar com os rumos tomados por este partido, que foi um importante instrumento da luta dos trabalhadores, mas que, ao chegar no poder, transformou-se em aplicador dos planos do capital. Por isso fundamos o PSOL.
Não espero que este caminho escolhido pelo PT há vários anos vá agora mudar. Portanto, o objetivo deste texto não é discutir estas diferenças irreconciliáveis ou propor ao governo que faça o que o PSOL faria se governasse o Brasil. Não alimento ilusões de que este governo possa deixar de atacar os interesses do povo através de uma política econômica de ajuste fiscal e de medidas que fragilizam direitos sociais. Não vou aqui apelar para que Dilma aplique medidas que mexam nos privilégios dos de cima, dos bancos e milionários, pois este é um programa pelo qual lutamos e seguiremos lutando nas ruas e também nos processos eleitorais futuros.
A situação de urgência neste momento é o iminente golpe político que nosso país está prestes a vivenciar. O que ocorreu ontem na Câmara dos Deputados, com a imposição do voto secreto que deu à oposição de direita uma vitória claramente golpista, é uma expressão clara de um processo ilegítimo que visa alcançar o impeachment. Este processo de impeachment, conduzido por Eduardo Cunha, não tem legitimidade alguma, pois vem sendo conduzido com métodos golpistas e através de manobras fraudulentas. Um presidente da Câmara sobre quem pairam acusações gravíssimas não tem autoridade política ou moral para conduzir um processo de destituição de um governo eleito.
Nosso primeiro desafio é, portanto, derrotar Cunha, seu impeachment e colocar para fora este representante máximo da máfia no Congresso. Tenho enorme orgulho da postura da bancada do PSOL na Câmara, que sob a liderança do deputado Chico Alencar, tem sido incansável na luta contra Cunha desde o primeiro momento. É preciso seguir esta batalha para que este corrupto deixe a presidência da Câmara e vá para a cadeia. A partir daí é preciso ir além. Afinal, a simples continuidade do governo também não interessa ao povo.
É fato que,mesmo Dilma tendo sido recentemente reeleita, já padece de absoluta falta de apoio popular. Com toda razão o povo está indignado com a corrupção desenfreada que a Operação Lava Jato vem revelando e que envolve altos escalões de vários partidos. Está claro que a roubalheira não é fruto apenas do mau comportamento de alguns, mas um método de governo, e não só deste governo, que une partidos e grandes empresas no saque aos cofres públicos.
Não menos justa é a indignação popular com o desemprego que vem crescendo, com a carestia e com a deterioração cada vez maior dos serviços públicos, pelos quais os trabalhadores pagam uma alta carga tributária, muito mais do que os rentistas e milionários, protegidos por isenções e pela leniência com a sonegação.
Por isso, assim como não podemos aceitar um impeachment golpista, também não podemos nos alinhar na defesa de um governo que foi eleito com um discurso oposto ao programa que implementa.
Diante desta situação de absoluta falta de credibilidade e representatividade do governo e das instituições que deveriam zelar pelo interesse público, urge uma reorganização do país antes que as forças da oposição de direita consigam derrubar o governo pela força de manobras golpistas e o país seja entregue ao Vice-Presidente Michel Temer. Um vice cujo apoio popular, mostram as pesquisas, não passa de 2%, a metade do apoio que tem o meu nome, por exemplo, na mesma pesquisa. E, ainda mais grave, um vice que propõe um programa de ataques ainda mais cruéis contra os direitos do povo, como expresso na chamada “Agenda Temer”, uma agenda de neoliberalismo explícito.
A proposta que apresento neste momento crucial para os rumos do país é que a derrota do impeachment seja acompanhada pelo governo Dilma assumindo a responsabilidade de propor que as eleições municipais de 2016 se transformem em eleições gerais para renovar todos os parlamentos e o Poder Executivo. Eleições sem financiamento privado, conforme decidido pelo STF, e com direitos iguais para todos os candidatos.
Através de novas eleições o povo poderá expressar o seu descontentamento de forma direta, sem a intermediação de políticos e partidos golpistas, que se aproveitam da indignação popular para impor os seus interesses. Esta mudança no calendário eleitoral é absolutamente necessária diante da gravidade da situação, e nestes momentos de grave crise, mais do que nunca, é o povo quem deve ter a palavra final, e não as castas políticas em seus conluios escusos.
Acredito que só assim, com um chamado ao povo para que tome as decisões sobre o futuro do país nas suas próprias mãos, poderemos impedir que o país siga à deriva – e com os prejuízos sendo arcados pelos trabalhadores mais pobres e pela classe média – ou ainda que este governo seja substituído por outro ainda mais frágil e rendido aos interesses do grande capital e ainda mais afastado dos interesses do povo.